Pular para o conteúdo principal

Minha goiabeira querida


A minha goiabeira querida, ficava no quintal de casa, aqui mesmo em Esperança. Apesar de pobres, tínhamos um quintal vasto, onde papai plantava chuchu para complementar a renda familiar; e mamãe algumas ervas medicinais, verduras e um pouco de cheiro verde.
O pé de goiaba ficava encostado no muro vizinho. Era um problema, pois dizia-se que estava prejudicando o imóvel confinante. Além disso, os sobrinhos daquela senhora sempre subiam a murada para pegar as goiabas, quando não desciam e entravam no nosso quintal.
Um deles - que anos depois - veio ser meu amigo de escola, confessou-me fazer dessas traquinagens. Amizade feita, participamos das brincadeiras e já não éramos inimigos...
Mamãe fazia doces de goiaba em calda. Servia para a família. Nunca pensamos em vender as goiabas, pois eram o lanche diário e na escola acompanhava as bananas também plantadas naquele terreno.
O quintal se dividia em três partes, sendo esta a segunda. A terceira era "sinistra", com um matagal que não ousávamos atravessar. Nele, certa feita, encontrei uma pedra de corisco que meu pai levou para exibir no trabalho; era cor de vinho bem escura, uma pedra mui lisa. Nunca mais voltou para casa, nem soube do seu destino.
Também achei, de muito antigo, um gancho de apear animais... anos depois, soube que meu tio, quando menino, usava o terreno para acomodar animais que vinham para a feira do sábado, cobrando-lhes uns trocados dos sitiantes que ali acorriam.
Talvez datasse dessa época, porém acho pouco provável, pois em conversa informal este me disse que usava apenas tocos de madeira para amarrar os muares.
Lembro que o banheiro ficava no final da primeira parte do terreno... à noite tínhamos que ligar a luz e correr até chegar ao banheiro, que na verdade era um quartinho com um buraco no chão com uma fossa séptica ao lado, construção essa orientada pelo SESP.
Entre os irmãos era comum quando um deles precisava ir ao banheiro à noite, sair correndo e, no meio do caminho, o outro desligar a luz, ficando o necessitado em pleno breu. Era hilário e seguia-se uns puxões de orelha ao incauto.
Era uma antiga parte da cidade, a residência era frente para a chamada Rua do Sertão; e por trás dava para a "Lagoa da porta" e o mercado público construído por Arlindo Delgado. Nos anos 60, fora aberta uma avenida pelo prefeito Luiz Martins, denominando-se de Rua José de Andrade.
Próximo, já numa outra esquina, ficava o "motor de luz" da antiga SAELPA, que depois ficou servindo de depósito para os postes.
Lá tinha um velho tanque de pedra, em que os meninos tomavam banho. Nunca tive coragem. Era estreito e fundo, falavam em 10 metros...
Papai era um homem muito corajoso. Serviu a aeronáutica. Não tinha medo de nada, mas certa feita, ao aguar o chuchuzeiro por volta das 21 horas, viu no céu uma luz em forma de círculo. Entrou branco em casa. Passou uma semana sem falar no assunto.
A partir de então, fiquei responsável pela troca da mangueira de um pé para outro de chuchu... muito medroso que era, este escritor levava consigo rezas e benzas de cor. Nunca vi nada além da minha imaginação, de folhas secas que se transformavam em insetos peçonhentos.
Boas memórias de um tempo lúdico, feliz e inocente.

Rau Ferreira

Comentários

  1. Muito interessante seu texto Rau Ferreira, certa convivência com árvores frutíferas faz muito bem para jovens,para adultos e crianças;consciêcia humana da beleza divinal da natureza, inclusive é provado cientificamente ser menos estressante a vida próximo a esses seres,os chamo independente das espécieis de árvores de vida,pois geram qualdade de vida por suas diversas utilidades: são ar condicionados naturais,são alimentos saúdáveis,são as sombras que realçam em maravilhosos contrastes de luz,uma alegria dos raios luminosos de sol ao permeiar suas folhagens.Quem dera todos os habitantes deste planeta tivessem essse privilégio que você teve, de ter uma infância com um quintal de árvores e plantas,conhecer as qualidades, os benefícios disto,sentir a natureza em meio a uma urbanização cinza,sem graça e incompleta se não for ladeada pelo verde da vida!

    ResponderExcluir
  2. Sobre o antepenúltimo parágrafo,quando relata seu pai ter visto no céu uma luz em forma de círculo...Isso me faz lembrar que na década de 80,aqui em Esperança há pessoas que relataram ficar assustadas com um círculo de luz que parecia se distanciar e se aproximar,até produzia efeito de cores, e na Rua Joviniano Sobreira inclusive foi visto por meus pais entre muitas outras pessoas,depois foi esclarecido esse caso: Experiências no centro de Lançamento da Barreira do Inferno no Rio Grande do Norte.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Obrigado pelo seu comentário! A sua participação é muito importante para a construção de nossa história.

Postagens mais visitadas deste blog

Zé-Poema

  No último sábado, por volta das 20 horas, folheando um dos livros de José Bezerra Cavalcante (Baú de Lavras: 2009) me veio a inspiração para compor um poema. É simplório como a maioria dos que escrevo, porém cheio de emoção. O sentimento aflora nos meus versos. Peguei a caneta e me pus a compor. De início, seria uma homenagem àquele autor; mas no meio do caminho, foram três os homenageados: Padre Zé Coutinho, o escritor José Bezerra (Geração ’59) e José Américo (Sem me rir, sem chorar). E outros Zés que são uma raridade. Eis o poema que produzi naquela noite. Zé-Poema Há Zé pra todo lado (dizer me convém) Zé de cima, Zé de baixo, Zé do Prado...   Zé de Tica, Zé de Lica Zé de Licinho! Zé, de Pedro e Rita, Zé Coitinho!   Esse foi grande padre Falava mansinho: Uma esmola, esmola Para os meus filhinhos!   Bezerra foi outro Zé Poeta também; Como todo Zé Um entre cem.   Zé da velha geração Dos poetas de 59’ Esse “Z...

A minha infância, por Glória Ferreira

Nasci numa fazenda (Cabeço), casa boa, curral ao lado; lembro-me de ao levantar - eu e minha irmã Marizé -, ficávamos no paredão do curral olhando o meu pai e o vaqueiro Zacarias tirar o leite das vacas. Depois de beber o leite tomávamos banho na Lagoa de Nana. Ao lado tinham treze tanques, lembro de alguns: tanque da chave, do café etc. E uma cachoeira formada pelo rio do Cabeço, sempre bonito, que nas cheias tomava-se banho. A caieira onde brincávamos, perto de casa, também tinha um tanque onde eu, Chico e Marizé costumávamos tomar banho, perto de uma baraúna. O roçado quando o inverno era bom garantia a fartura. Tudo era a vontade, muito leite, queijo, milho, tudo em quantidade. Minha mãe criava muito peru, galinha, porco, cabra, ovelha. Quanto fazia uma festa matava um boi, bode para os moradores. Havia muitos umbuzeiros. Subia no galho mais alto, fazia apostas com os meninos. Andava de cabalo, de burro. Marizé andava numa vaca (Negrinha) que era muito mansinha. Quando ...

Esperança, por Maria Violeta Silva Pessoa

  Por Maria Violeta da Silva Pessoa O texto a seguir me foi encaminhado pelo Professor Ângelo Emílio da Silva Pessoa, que guarda com muito carinho a publicação, escrita pela Sra. Maria Violeta. É o próprio neto – Ângelo Emílio – quem escreve uns poucos dados biográfico sobre a esperancense: “ Maria Violeta da Silva Pessoa (Professora), nascida em Esperança, em 18/07/1930 e falecida em João Pessoa, em 25/10/2019. Era filha de Joaquim Virgolino da Silva (Comerciante e político) e Maria Emília Christo da Silva (Professora). Casou com o comerciante Jayme Pessoa (1924-2014), se radicando em João Pessoa, onde teve 5 filhos (Maria de Fátima, Joaquim Neto, Jayme Filho, Ângelo Emílio e Salvina Helena). Após à aposentadoria, tornou-se Comerciante e Artesã. Nos anos 90 publicou uma série de artigos e crônicas na imprensa paraibana, parte das quais abordando a sua memória dos tempos de infância e juventude em e Esperança ” (via WhatsApp em 17/01/2025). Devido a importância histór...

Luiz Pichaco

Por esses dias publiquei um texto de Maria Violeta Pessoa que me foi enviado por seu neto Ângelo Emílio. A cronista se esmerou por escrever as suas memórias, de um tempo em que o nosso município “ onde o amanhecer era uma festa e o anoitecer uma esperança ”. Lembrou de muitas figuras do passado, de Pichaco e seu tabuleiro: “vendia guloseimas” – escreve – “tinha uma voz bonita e cantava nas festas da igreja, outro era proprietário de um carro de aluguel. Família numerosa, voz de ébano.”. Pedro Dias fez o seguinte comentário: imagino que o Pichaco em referência era o pai dos “Pichacos” que conheci. Honório, Adauto (o doido), Zé Luís da sorda e Pedro Pichaco (o mandrião). Lembrei-me do livro de João Thomas Pereira (Memórias de uma infância) onde há um capítulo inteiro dedicado aos “Pichacos”. Vamos aos fatos! Luiz era um retirante. Veio do Sertão carregado de filhos, rapazes e garotinhas de tenra idade. Aportou em Esperança, como muitos que fugiam das agruras da seca. Tratou de co...

A menor capela do mundo fica em Esperança/PB

A Capelinha. Foto: Maria Júlia Oliveira A Capela de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro está erigida sob um imenso lajedo, denominado pelos indígenas de Araçá ou Araxá, que na língua tupi significa " lugar onde primeiro se avista o sol ". O local em tempos remotos foi morada dos Índios Banabuyés e o Marinheiro Barbosa construiu ali a primeira casa de que se tem notícia no município, ainda no Século XVIII. Diz a história que no final do século passado houve um grande surto de cólera causando uma verdadeira pandemia. Dona Esther (Niná) Rodrigues, esposa do Ex-prefeito Manuel Rodrigues de Oliveira (1925/29), teria feito uma promessa e preconizado o fim daquele mal. Alcançada a graça, fez construir aquele símbolo de religiosidade e devoção. Dom Adauto Aurélio de Miranda Henriques, Bispo da Paraíba à época, reconheceu a graça e concedeu as bênçãos ao monumento que foi inaugurado pelo Padre José Borges em 1º de janeiro de 1925. A pequena capela está erigida no bairro da Bele...