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A mulher e o rei (conto popular)

 

Conto popular é um gênero literário que tem origem na oralidade; são tradições contadas e recontadas pelo povo ao longo do tempo, de cunho filosófico ou recreativo. O Brasil possui diversos contistas que narram estórias encantadas, lendas e “causos”. Por anos a fio os folcloristas recolhem em textos, e publicam em livro o resultado de suas pesquisas. Proeminentes estudiosos do tipo popular são o potiguar Câmara Cascudo (1898-1986) e o alagoano – radicado paraibano – Altimar de Alencar Pimentel (1936-2008).

Por aqui notabiliza-se o Sr. Vicente Simão. Funcionário público estadual, que trabalhou muito tempo na Escola “Irineo Joffily” com o professor José Coelho; é um importante contador de histórias tanto que muitos estudantes o procuram para realizar seus trabalhos sobre a cidade de Esperança. Há outros, porém, mas por ora esse não é o objetivo deste trabalho.

A narrativa que hoje trago faz parte da minha infância. Minha mãe costumava falar de lendas e coisas do tipo, às vezes para expressar um princípio que acreditava ser importante para as nossas vidas. Uma que me marcou bastante foi a estória da mulher e o rei.

Diz-se que em tempos imemoriais, cansado da vida palaciana, um rei saiu a caminhar adentrando pela floresta. Desavisado, sem conhecer o caminho, perdeu-se na mata e passou alguns dias sem se alimentar direito, vivendo apenas de alguns frutos que encontrara. Após andar alguns dias a procura de uma saída, deparou-se com uma pequena choupana, onde resolveu pedir abrigo.

Naquela casinha simples morava uma mulher idosa. Quando o regente lhe bateu à porta, ela estava a preparar um guisado. Era a sua única refeição do dia. O rei de pronto pediu-lhe socorro, e disse-lhe há quanto tempo vagava no mato e quão faminto estava. A senhora dividiu o seu prato, comendo-o o rei, muito satisfeito disse:

- Essa é a melhor refeição que já saboreei na vida! Que delícia, que coisa maravilhosa; quando retornar para o meu castelo, darei lhe boa recompensa.

De fato, os seus súditos leais estavam a sua procura, desde o seu desaparecimento. Cães farejadores vasculhavam as matas, até que encontraram o regente, resgatando-o. Mas a promessa de um rei não pode ficar em vão, a sua palavra não volta atrás. Reassumindo o trono, cuidou logo de convidar aquela senhora para um banquete, pedindo-lhe que preparasse de novo o guisado tão saboroso. A velha não se fez de rogada, e cumpriu o desejo do monarca. Servida a refeição não foi o que o rei esperava:

- Esse prato não está bom! O que foi que a senhora fez, que da última vez me pareceu delicioso?

- É que naquele dia – meu caro rei – o senhor estava faminto, já há dias não se alimentava direito e qualquer coisa que lhe servisse iria lhe parecer um manjar. Hoje, em seu palácio, estais satisfeito, de maneira que a melhor refeição para ti não terá o mesmo sabor.

Moral da estória, quando estamos na escassez pois mais simples que as coisas pareçam tudo se mostra maravilhoso. Ao passo que, a vida regalada, não traz benefício algum, nem para o corpo e, muito menos para a alma, pois quando estamos satisfeitos não damos valor às coisas importantes da vida.

Isso me lembrou uma parábola de Lázaro e o rico... mas essa é uma outra história!

 

Rau Ferreira

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