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Abolição, Silvino Olavo


O Professor Charlinton Machado, em coautoria com Maria Lúcia da Silva Nunes e Daniella de Souza Barbosa, fez publicar na revista Interfaces Científicas, um importante artigo sobre o poeta esperancense Silvino Olavo da Costa, denominado “Escritos de solidão e silêncio”.

De fato, os manuscritos que estão sob a responsabilidade do HISTEBR-GH/PB – Grupo de Estudos e Pesquisas, Sociedade e Educação do Brasil, em sua maior parte sem datação, mas com uma indicação de início em 1935, quando o vate estava relegado ao ostracismo, e encontrando-se internado para tratamento de sua esquizofrenia, foram produzidos após a sua interdição.

São “rabiscos” produzidos em folhas esparsas de livros a que Silvino tinha acesso, pois apesar de estar longe das lides literárias, nunca deixou de produzir, sendo o prefácio do livro “Miséria”, de Leonel Coelho (1933) um bom exemplo.

O artigo – segundo seus próprios autores – “se propõe lançar luz sobre os manuscritos inéditos de Silvino Olavo da Costa, 50 anos após sua morte, compreendendo sua trajetória, inserção e contribuição nos espaços intelectuais de sua época”.

Dos vários inéditos que se encontram publicados naquela revista, e dos muitos outros que não vieram à lume, dos quais tive contato por franca permissão do Professor Charlinton, chamou-me a atenção o que se intitula “Abolição”, o qual reproduzo a seguir:

 

ABOLIÇÃO

São direitos de ordem natural.

E os deve consagrar a liberdade!

Aonde quer que se encontre a humanidade

Há o mérito e o demérito, afinal

De Quesney, de Centauro ou Juvenal...

Seja a sentença – há o timbre da verdade;

E em função da mudança cultural

Constituem-se os homens em sociedade!

 

A teoria do núcleo citadino...

Em princípio, não diminui o clã

Nem os fatores geográficos altera.

 

Todavia, no Tribunal Divino,

Não há que facilitar aos ideais de pai

O retrato do pingo d´água ou da cratera.

 

E de forma brilhante, comentam os autores de “Escritos de solidão e silêncio”, sobre o poema Abolição:

O poema traz marcas da ciência e da fé cristã, cuja escravidão e, por conseguinte, o debate da abolição, constituiu-se em tema recorrente, dada a tradição escravocrata da organização histórica do Brasil. De forma erudita, Silvino Olavo da Costa busca referências nos nomes da Filosofia do Direito. E, ao discorrer sobre o cenário de ‘mudança cultural’, deixa entrever que seria inevitável a consagração da liberdade humana, pois, ela própria era uma imposição da evolução da vida civilizada dos homens em sociedade

 

Dos fatos que me veem à lembrança, da ânsia do poeta em retornar aos círculos literários, há o poema “Cisco” (1935), publicado no jornal “A Manhã”, do Estado de Pernambuco; o seu restabelecimento, anunciado pelo cunhado Waldemar Cavalcanti, com o anúncio da publicação de “Harmonia das Esferas” (1952); a reedição das suas obras, prometida por Chico Souto (1961) e, por ocasião da inauguração do Estádio “José Ramalho da Costa”, quando o poeta entregou, também às mãos de Chico Souto (1956), em um papel “semirroto e empalidecido” o poema “O Trem de Ferro”.

Esse último episódio é citado por Amaury Vasconcelos, fundador e presidente da Academia de Letras de Campina Grande – ALCG, que assistiu a inauguração do estádio:

Que belo tema, da descrição onomatopaica, dos sons da máquina, dos seus silvos estridentes, rompendo nas paralelas e rodas sobre elas, o vento, no zumbido unido ao som agudo dos aços em atrito, repito rodas trilhos. E tudo mais se embelezava, quando seu estro, na velocidade dele imaginosa passageiro, tudo via no rápido da visão, que se extasiava no contemplativo da paisagem, colorida e bela, caleidoscópica, com horizontes que se barravam em montes ciclópicos, rígidos, penedos enegrecidos, por vezes esmaecidos nos verdes pálidos das heras que garimpavam a serra. Chico Souto deteve o escrito e dele jamais tomei notícia, embora lhe cobrasse uma cópia”.

 

Em todas essas tentativas, desacreditado por sua doença mental, embora nos idos de 1950, morando em Esperança-PB, já apresentasse melhora de seu quadro, atestada por seus familiares, não lhe foi possível o retorno tão esperado, talvez por isso, e para fugir à solidão e ao esquecimento em que se encontrava trancafiado, escrevesse a sua musa em páginas de livros aos quais tinha acesso, e que o HISTEBR trás à lume, nesse artigo dos professores Charlinton, Maria Lúcia e Daniella Barbosa. Parabéns pelo resgate, em nome do poeta.

 

Rau Ferreira

 

- NUNES, Maria Lúcia da Silva. MACHADO, Charlinton José dos Santos. BARBOSA, Daniella de Souza. SILVINO OLAVO DA COSTA: ESCRITOS DE SOLIDÃO E SILÊNCIO. Interfaces Científicas. Educação – Vol. 11, Nº 3. Editora Universitária Tiradentes. ISSN Digital 2316-3828. Aracajú/SE: 2022.

- O NORTE, Jornal. Edição de 17 de agosto. João Pessoa/PB: 1952.

- OLAVO, Silvino. Badiva: poesias inéditas de Silvino Olavo. Marinaldo Francisco de Oliveira (Org.). Secretaria Municipal de Educação e Cultura. Esperança/PB: 1997.

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