Estavam reunidos em Campina Grande, na Paraíba, quatro
cantadores glosando ao copo, da fina poesia popular, cada qual com sua poesia e
irreverência, saudando o companheiro, quando um circunstante lhes propôs um
mote.
Era eles Egídio de Oliveira Lima (1904/1965), João
Benedito Viana (1860/1942), Elízio Felix “Canhotinho” de Souza (1915/1965) e
José Virgulino “Mergulhão” de Souza (1907/1939). Na oportunidade, teriam que
glosar sobre a seguinte frase: “Egídio Lima em Campina, João Viana no Picuí,
Canhotinho no Cardoso e Mergulhão no Cariri”.
O mote que lhes foi dado, não era dos mais fáceis, e
suscitava os quatro amigos a declamarem a sua rota de defesa. Com efeito, era
natural que os cantadores, naquele tempo, criassem uma rota sob a qual exerciam
o seu domínio.
Se um companheiro quisesse cantar naquela região, deveria
pedir autorização ao cantador, que impunha respeito pelos seus versos. Há quem
diga que a desobediência era punida com surra de cacete e briga de faca.
Após o desafio, cada um deles soltou a voz, em resposta,
iniciando Egídio:
“Só em Egídio se fala,
Na Paraíba do Norte,
Sonetista muito forte,
No repente nao se cala.
Improvisa como bala
Quando saí da carabina
Tem memória e tem repente,
Intimida muita gente
Egídio Lima em Campina”.
João Benedito inicia seus versos denunciando logo a
sua origem, pois tal qual Egídio esse era natural de Esperança/PB:
“Eu como velho cantador
De Egídio seu conterrâneo
Meu gênio subterrâneo
explode com mais ardor.
Já fui improvisador
Neste terreno daqui
A ninguém nunca temi
No braço duma viola.
O repente é quem consola
João Viana em Picuí”.
Canhotinho cantou com Lourival Batista, Estrelinha e Josué
da Cruz, era apreciado por intelectuais, como Raymundo Asfora. Cantava no
Casino da Lagoa, na Rainha da Borborema. É de sua autoria os versos da “Ave
Maria”, citado por Câmara Cascudo. Na sua vez de cantar, disse:
“Estou fazendo uma trova
Para não ser repelido
embora eu solte o gemido
Que meu peito agora aprova.
Minha rima é sempre nova
No tema mais deleitoso.
Neste momento ditoso.
Tudo é bom para o meu ver.
Há muito vivo a sofrer
Canhotinho no Cardoso”.
Por fim chegou a vez de José Mergulhão, poeta do
Juazeiro no Ceará, declamar os versos em torno do mote. Esse cantador faleceu
ainda moço, no ano de ’39 do Século passado. Ao ver se aproximar “Caetana”
(a morte), disse a Ascendino Alves dos Santos, que também era repentista popular:
“Quem viu Mergulhão outrora,
Vendo hoje não conhece!
Cada repente que faz
É uma dor que aparece
Cada palavra que solta
É uma lágrima que desce!”.
Este último, respondeu em versos sob o mote do
cidadão, que ouvia os quatro companheiros, a brindar a sua cantoria:
“Já fui risonho e feliz
No tempo da mocidade,
de tudo ria à vontade
Neste meu belo País.
Mas, a sorte contradiz
E do inditoso ele ri...
Põe o homem no jequi
Ou mesmo na desventura.
Hoje é triste criatura,
Mergulhão no Cariri”.
Egídio de Oliveira Lima escreveu diversos artigos
sobre a literatura de cordel para as revistas Ariús (Campina Grande) e Manaíra
(João Pessoa), das quais foi colaborador e redator. Dirigiu a revista “As
fogueiras de São João” (1941) e foi o responsável por colecionar as antigas edições
dos folhetos de Leandro Gomes de Barros - festejado autor cordelista paraibano
- e de outros autores, cedido posteriormente a Universidade da Paraíba.
Egídio tinha Benedito como “a alma dos cantadores”.
O Viana gostava de fumar, com o cigarro no canto da boca; e tomava uma bicada,
revezando os versos na viola. Essas foi a primeira referência que encontramos,
sobre a residência do poeta no Picuí, pois até então sabíamos que este residiu
na Rua do Boi em Esperança, e que faleceu em Lagoa do Remígio.
Rau Ferreira
Referências:
-
- FERREIRA, Rau. João
Benedito: o mestre da cantoria (um conto de repente). 2ª Edição. Edições
Banabuyé. Esperança/PB: 2017.
-
ALMEIDA, Átila Augusto e
SOBRINHO, José Alves. Dicionário bio-bibliográfico de repentistas e poetas de
bancada Volumes 1-2. Ed. Universitária: 1978, p. 250.
-
O NORTE, Jornal. Edição
de 26 de julho. João Pessoa/PB: 1953.
-
SOBRINHO, José Alves.
Cantadores, repentistas e poetas populares. Bagagem. Campina Grande/PB: 2003.
Folgo saber que o poeta repentista Egídio Oliveira Lima era meu primo em segundo grau pois que filho era ele do meu tio avô, Francisco Jesuíno de Lima, que tinha o mesmo nome do meu bisavô, Francisco Jesuíno de Lima, pai de minha avó materna, Porfiria Jesuíno de Lima.
ResponderExcluirAproveito a oportunidade para falar um pouco sobre a família de Egídio Oliveira Lima, cujo pai, o meu tio avô, Francisco Jesuíno de Lima, desconfio eu, que ele tinha um outro prenome antes de Francisco e este prenome seria Antônio. Seu nome completo seria, portanto, Antônio Francisco Jesuíno de Lima.
Isto porque ele, o meu tio avô, para ter o nome igual só do meu bisavô, Francisco Jesuíno de Lima, teria que ser Francisco Jesuíno de Lima Filho, e não era assim o seu nome.
TB pq os filhos desse meu tio avô foram: Egídio Lima,
Sebastião Lima, Elvira Lima, Margarida Lima e Severina Lima, não necessariamente nessa ordem.
Severina Lima foi a paixão do grande poeta Silvino Olavo, segundo me contava minha tia avó, Enedina, irmã de "Antônio" Francisco Jesuíno de Lima, como TB contavam-me minha mãe e meu pai. Todos eles, meus pais, minhas tias avós, etc., sabiam desse romance, que não teve um final feliz pq as famílias eram inimigas. Minha tia avó, Enedina, chegou a me contar detalhes desse idílio proibido, e um desses detalhes foi o de que a minha prima Severina Lima era considerada pela mãe de Silvino Olavo, moça pobre para o seu filho grã-fino, e que preferia vê-lo louco do que casado com ela.
Esse fato, público e notório, consta do livro de Rau Ferreira sobre Silvino Olavo (de quem sou profundamente admiradora), sendo que o pai de Severina Lima aparece no livro de Rau Ferreira com o nome de Antônio Cambeba, que, acredito eu, fosse o apelido do meu tio avô, "Antônio" Francisco Jesuíno de Lima.
Maria das Graças Duarte Meira