Pular para o conteúdo principal

Sol: A morte na infância

Silvino Olavo fora o primogênito de vinte irmãos, dos quais muitos deles tiveram morte prematura. Em Sombra Iluminada (1927) o poeta expressa o sentimento de melancolia que marcou a sua infância e escreve o soneto dedicado à memória de seus fraternos.
Escreve que a sua infância assistiu o nascer de vinte irmãos – vinte punhais sem jóias de alfazema cravados n’alma dos meus pais cristãos! – muitos vieram à luz ainda na fazenda Lagoa do Açúde, propriedade do velho Coronel Candido, amparados por alguma parteira e acalentados pelas mãos de dona Josefa.
Na época eram muitas as doenças que acometiam os recem-nascidos e não se conhecia tratamento para certas patologias, atribuindo-se o falecimento as febres em geral. A religiosidade de então confortava os pais pois tudo era desígnio dos céus.
Assim SOL escreve à morte – álgida luz deste poema e dona de todos os meus sonhos vãos – que levou seus treze pequeninos baixando a sua algema e ungindo as mãos do menino. Quem sabe imaginando como seria se estes mesmos houvessem sobrevivido e antevendo na perspectiva da medicina moderna uma outra solução.
Mas tudo isto é em vão apenas o ressentir destas memórias lhe preenchem o coração por isso mesmo cerrava as pálpebras e recompunha o seu tesouro.
Vejamos o soturno poema DÓ:

À memória de meus treze irmãos


Minha infância, embriagada de alfazema,
Assistiu ao nascer de vinte irmãos –
Vinte e um punhais sem jóias de alfagema
Cravados n’alma dos meus pais cristãos!

A morte, álgida luz deste poema,
- dona de todos os meus sonhos vãos,
treze vezes baixou a sua algema,
treze vezes me ungiu com as suas mãos!

A voz de sua cítara de agouro
Às vezes cerro as pálpebras doridas
Recompondo o meu íntimo tesouro...

E nos meus olhos ficam refletidas,
A reluzirem como gotas de ouro,
Estas melancolias coloridas...

Carlos Dias Fernandes, escrevendo sobre o colega de redação em 1927, trata desses dias com igual importância. “Foi ele, assim, o primogênito dessa luzida cauré de sertanejos, de que ainda restam oito, atestando a salubridade dos pais e da pequena vila serrana, onde parece que eram perdidas as dríades e as musas, nostálgicas do desfeito Olímpo”.

Rau Ferreira

Fonte:
- OLAVO, Silvino. Sombra iluminada. Rio de Janeiro: 1927. 120 páginas não numeradas. Ex-libris do autor;
- FERNANDES, Carlos Dias. Poetas Novos e Velhos, Sombra Iluminada. A União: 1927;
- FERREIRA, Rau. Silvino Olavo. Edições Banabuyé. Epgraf: 2010.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Capelinha N. S. do Perpétuo Socorro

Capelinha (2012) Um dos lugares mais belos e importantes do nosso município é a “Capelinha” dedicada a Nossa Senhora do Perpétuo do Socorro. Este obelisco fica sob um imenso lagedo de pedras, localizado no bairro “Beleza dos Campos”, cuja entrada se dá pela Rua Barão do Rio Branco. A pequena capela está erigida sob um imenso lajedo, denominado pelos indígenas de Araçá ou Araxá, que na língua tupi significa “ lugar onde primeiro se avista o sol ”. O local em tempos remotos foi morada dos Índios Banabuyés e o Marinheiro Barbosa construiu ali a primeira casa de que se tem notícia no município, ainda no Século XVIII. Consta que na década de 20 houve um grande surto de cólera, causando uma verdadeira pandemia. Dona Esther, esposa do Ex-prefeito Manuel Rodrigues de Oliveira, teria feito uma promessa e preconizado o fim daquele mal.  Alcançada a graça, fez construir aquele símbolo de religiosidade e devoção. Dom Adauto Aurélio de Miranda Henriques, Bispo da Paraíba à ...

A menor capela do mundo fica em Esperança/PB

A Capelinha. Foto: Maria Júlia Oliveira A Capela de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro está erigida sob um imenso lajedo, denominado pelos indígenas de Araçá ou Araxá, que na língua tupi significa " lugar onde primeiro se avista o sol ". O local em tempos remotos foi morada dos Índios Banabuyés e o Marinheiro Barbosa construiu ali a primeira casa de que se tem notícia no município, ainda no Século XVIII. Diz a história que no final do século passado houve um grande surto de cólera causando uma verdadeira pandemia. Dona Esther (Niná) Rodrigues, esposa do Ex-prefeito Manuel Rodrigues de Oliveira (1925/29), teria feito uma promessa e preconizado o fim daquele mal. Alcançada a graça, fez construir aquele símbolo de religiosidade e devoção. Dom Adauto Aurélio de Miranda Henriques, Bispo da Paraíba à época, reconheceu a graça e concedeu as bênçãos ao monumento que foi inaugurado pelo Padre José Borges em 1º de janeiro de 1925. A pequena capela está erigida no bairro da Bele...

Zé-Poema

  No último sábado, por volta das 20 horas, folheando um dos livros de José Bezerra Cavalcante (Baú de Lavras: 2009) me veio a inspiração para compor um poema. É simplório como a maioria dos que escrevo, porém cheio de emoção. O sentimento aflora nos meus versos. Peguei a caneta e me pus a compor. De início, seria uma homenagem àquele autor; mas no meio do caminho, foram três os homenageados: Padre Zé Coutinho, o escritor José Bezerra (Geração ’59) e José Américo (Sem me rir, sem chorar). E outros Zés que são uma raridade. Eis o poema que produzi naquela noite. Zé-Poema Há Zé pra todo lado (dizer me convém) Zé de cima, Zé de baixo, Zé do Prado...   Zé de Tica, Zé de Lica Zé de Licinho! Zé, de Pedro e Rita, Zé Coitinho!   Esse foi grande padre Falava mansinho: Uma esmola, esmola Para os meus filhinhos!   Bezerra foi outro Zé Poeta também; Como todo Zé Um entre cem.   Zé da velha geração Dos poetas de 59’ Esse “Z...

Ruas tradicionais de Esperança-PB

Silvino Olavo escreveu que Esperança tinha um “ beiral de casas brancas e baixinhas ” (Retorno: Cysne, 1924). Naquela época, a cidade se resumia a poucas ruas em torno do “ largo da matriz ”. Algumas delas, por tradição, ainda conservam seus nomes populares que o tempo não consegue apagar , saiba quais. A sabedoria popular batizou algumas ruas da nossa cidade e muitos dos nomes tem uma razão de ser. A título de curiosidade citemos: Rua do Sertão : rua Dr. Solon de Lucena, era o caminho para o Sertão. Rua Nova: rua Presidente João Pessoa, porque era mais nova que a Solon de Lucena. Rua do Boi: rua Senador Epitácio Pessoa, por ela passavam as boiadas para o brejo. Rua de Areia: rua Antenor Navarro, era caminho para a cidade de Areia. Rua Chã da Bala : Avenida Manuel Rodrigues de Oliveira, ali se registrou um grande tiroteio. Rua de Baixo : rua Silvino Olavo da Costa, por ter casas baixas, onde a residência de nº 60 ainda resiste ao tempo. Rua da Lagoa : rua Joaquim Santigao, devido ao...

Esperança, cidade admirável (por Cristino Pimentel)

  Extraímos do jornal “O Norte” um texto de Cristino Pimentel, que era cunhado de Epaminondas Câmara, por ocasião de uma de suas visitas ao Cemitério “Nossa Senhora do Carmo” em Esperança-PB, na data de finados ao túmulo da família. Na oportunidade, também comenta sobre a festa da padroeira que à época era bem frequentada em nosso município. Vejamos a impressão do escritor campinense, com o título de “ Esperança, cidade admirável ”: “Quando dei a publicidade uma crônica sobre a alegre cidade de Esperança, tive que me reportar ao estado desolador do seu cemiteriozinho, - ainda com aspecto de “quadrado” de vila atrasada – e sugeri que o Prefeito dali devia, pelo menos, erguer o cruzeiro santo que o tempo impiedoso roeu e o deitou por terra, estando os pedaços da madeira apodrecida servindo de entulho na aléa principal. O meu grito amigo não foi ouvido, e parece-me que estou a escutar a censura ao gesto: “enxerido, tu tens nada que ver com a casa alheia, quando na tua o Prefeito t...