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Sol: por ele mesmo!



Silvino Olavo
Cotejei algumas passagens sobre o poeta SILVINO OLAVO em textos publicados na imprensa paraibana. Estes imprimem além do sentimento que lhe é peculiar, a autobiografia de si mesmo. Que o leitor tire suas próprias conclusões:

1) "Por mais indiferentes que parecessem à política as minhas tendências espirituais no Rio de Janeiro, onde tive a ventura de vos conhecer, enquanto, por uma dolência amarga do subconsciente, as caravelas do Sonho singravam-me os plácidos mares do pensamento, eu não podia deixar de ser, como fui, arrebatado pela visão miraculosa de um mundo novo, como a que serenou, há mais de quinhentos anos, a angústia e o desprezo no espírito dos tripulantes de Colombo, ao avistarem terras de América, vendo, como vi, descerrarem-se os velários e abrir, radiosamente, no cenário político de minha terra, o sorriso límpido de uma esperança nova, a aurora resplandecente de novas perspectivas amplamente libertas aos olhos já meios apreensivos dos paraibanos" (OLAVO, Silvino. Esperança - Lyrio Verde da Borborema. Discurso. A União. Parahyba do Norte: 1925).

2) "Quando regressei do Rio depois de 5 anos de Universidade. Trazia eu a alma povoada de sonhos e os ouvidos ressoantes de harmonias novas. Enquanto lutara lá pela vida, pela conquista de uma carta de advogado e pela publicação de alguns poemas tradicionalistas, lutara ele cá pelo pão amargo de todos os dias e pela realização do seu sonho de Poeta, ao lado de Eudes Barros – discípulo amado de Carlos D. Fernandes. Peryllo teve, por essa época, a infelicidade de cair nas palhas de um hospital de varioloses. E mal saira deu o seu livro. Recebi-o com instintivas reservas de conservação e o meu espírito, embora ansioso por tomar o pulso ao Poeta, recusou-se familiarizar-se com o livro por mero receio de contaminação. Surgiram então os primeiros artigos sobre as “Canções”. As transcrições foram me despertando o interesse pelo livro. Eram versos de fatura moderna encerrando uma poesia suavíssima de doutrinação divina. Fiquei admirando muito o autor daqueles versos magníficos, porém permanecia ainda tíbio, covarde para estudar-lhe a personalidade através daquela brochura em que eu pressentia a existência dos micróbios verrumantes da carne humana. Minha ingenuidade ainda era desse quilate. De tal sorte que aquele livro ficou sendo para mim uma espécie de casa mal-assombrada. Quando em fins de 1925 o dr. José Gaudêncio me convidou para chefiar a redação d'Jornal, desta capital, com liberdade para constituir o corpo de redatores, recebi uma visita do Poeta. Foi o meu primeiro encontro pessoal com o autor das “Canções”. Já estava ele então nomeado amanuense da Secretaria Geral do Estado e me solicitara de não deixar de incluí-lo entre os cooperadores do novo ciclo que aquele órgão iniciara na vida social e política da Paraíba. Seu apelo viera ao encontro das minhas cogitações. E formou-se aí, ao lado da “A União”, o cortiço intelectual mais laborioso e mais influente que era possível comportar a Província. Uma ronda magnífica de emulações e de afeto. O meu plastron parecia exercer uma sugestão centralizadora. E éramos todos: Gaudêncio, Maciel, Edésio, Alves Ayres, Eudes, Orris, José Tavares, Samuel Duarte, Silvino Olavo – os forjadores da mesma idéia, os arquitetos da mesma torre. Tudo isto é de ontem e já tem para mim um sabor de história. Lutando, realizando e vencendo, nos congregamos ali no sobrado 555, da Rua Direita, durante dois anos apenas. E assim viveramos nós o melhor período da nossa vida de letras e de lutas, entre o brilho de Eudes e Orris, as aparições de Samuel e a assiduidade de Peryllo Dolivira. Ele era o único que recebia regularmente os seus cento e cinquenta mil reis por mês. Não aumentávamos o nosso pão para não diminuirmos o pão daquele companheiro mais deserdado do que nós outros. E ninguém brigava nem se traía. Era uma só cordialidade comovente naquele reinado espiritual e fraterno de juventudes triunfadoras obedientes às aspirações do nosso povo. Mas entre todos foi saliente o papel de Peryllo, com o seu ritmo de resistência cívica e de concentração ao trabalho, levando a palma das reverberações o odisante espírito de Eudes Barros. Publicáramos ao fim desse período três livros de poemas “Caminhos cheio de sol”, “Canticos da terra jovem”, “Sombra Iluminada”. Este já estava feito quando entramos para essa tenda magnífica de atividade intelectual. Antecedera-lhes, nesta víride floração literária, um livro austero, de mestre: “Ensaios de crítica”. Sucedera-lhes uma notável construção artística: “A Bagaceira”.
O brilho ruidoso da administração João Pessoa e a dor da alma paraibana ao choque brutal do seu assassínio abafaram os últimos dias do magro cantor que viveu morrendo e cantando a vida, sem lástimas nem prantos. Consumiu-se como uma vela de cera. E cada lágrima rolada de suas pálpebras transformara-se em poema" (OLAVO, Silvino. Criadores e criaturas. Artigo. A União. Parahyba do Norte: 1931).

3) "Em nosso tempo, tanto para mim, como para Leonel, tudo eram silêncio, austeridade, circunspecções. Nunca me advertiram do que a vida fosse outra cousa! Não me deixara, nunca, dominar pelos jogos de nenhuma espécie nem mesmo me apaixonara pelo bilhar, senão pelos exercícios da arte da prosa e da poesia, pelo sistema de reatividades... Tudo, despretenciosamente, mais ou menos à margem da verdadeira história das cousas!... Entre ignorantes e sabidões, a vida tomou partido" (COÊLHO, Leonel. Misérias. (Poemas trágicos). Pref. de Silvino Olavo. Imp. Of., João Pessoa/PB: 1936).

Silvino Olavo – SOL – foi a maior expressão do Simbolismo na Paraíba. Nascido em Esperança, lutou pela sua independência. Publicou dois livros de poesias – Cysnes (1924) e Sombra Iluminada (1925) – e mesmo esquizofrênico, escrevia nas páginas em branco de seus livros os versos de Badiva (1997) e Alpha de Centauro (inédito). A sua última caminhada pela Beleza dos Campos foi em 1969, deixando muitas saudades e nossa admiração pelo seu espírito desprendido e poético.


Rau Ferreira

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