O dia 15 de janeiro de 1964 ficou conhecido como “A
tragédia de Mari”. O pequeno município da Paraíba registrou violenta discussão,
quando trabalhadores camponeses das Fazendas Olho d’água e Santo Antônio, que
intentavam fazer um mutirão, foram recebidos com violência pelos
administradores. O confronto resultou em 11 mortes e 4 feridos.
Esses acontecimentos foram criticados pela oposição
política da época, que responsabilizava o governador Pedro Gondim. Na contramão
da história, defendiam o gestor os deputados Francisco Souto Neto, Assis Lemos,
Agassiz Almeida, José Teotônio e Figueiredo Agra.
Diante daqueles fatos, Chico Souto ocupou a tribuna
para defender o governador, pronunciando as seguintes palavras:
“O homem público é muito injustiçado. A casa me conhece e sabe que eu não ocuparia
esta tribuna para defender o governador Pedro Gondim, um amigo de todas as
horas, se não tivesse certeza de que o seu comportamento, à frente do governo
do Estado, não fosse o de decidir, com equilíbrio, as demandas entre as mais
variadas classes sociais” (COELHO: 20004).
O deputado esperancense compreendia bem a posição
dos seus companheiros, que estavam constrangidos em emprestar apoio ao
governador, porém chamava-lhes a atenção, “para que, em nome de uma oposição
que era passageira, eles não viessem, com atitudes e pronunciamentos
contundentes, cometer injustiças contra um homem da dimensão do governador
Pedro Gondim”.
Chico Souto distanciara-se do posicionamento arenista, demonstrando certa simpatia ideológica comunista: protestou contra as explosões
atômicas norte-americanas na região Nordeste, contribuiu para o VII Festival
Mundial da Juventude e dos Estudantes pela Paz e Amizade, ajudou atividades
internas do PCB, e dirigiu os trabalhos da Faculdade de Direito de João Pessoa,
quando recebeu a genitora de Che Chevara e manteve contato com o dirigente
comunista Jacob Gorender.
Como resultado desses envolvimentos, foi considerado
como agitador e subversivo, e teve seu mandato cassado em 1969, juntamente com
Robson Duarte Espínola, Romeu Gonçalves de Abrantes, José Targino Maranhão,
Mário Silveira, Ronald de Queiroz Fernandes e Silvio Pélico Porto.
Chico ainda chegou a ser indiciado no Inquérito
Policial Militar da Subversão, junto com 52 pessoas, que sugeriu que o
ex-deputado fosse “enquadrado” em novo IPM complementar, por entender a sua
culpabilidade (Relatório, 1964, p. 1.647/1.648).
As perseguições chegaram ao Município de Esperança,
porquanto o juiz corregedor da época acusou o magistrado Manoel Augusto de
Souto Lima, parente de Chico, de estar “agitando o meio político-social da
cidade de Esperança”; o nosso conterrâneo, Dr. João de Deus Melo, Juiz de
Picuí, também “sofreu pena de advertência imposta pelo Conselho Superior de
Justiça, em decisão de 23 de julho de 1968” (NUNES: 2017).
Francisco Souto Neto exerceu o mandato de Deputado
Estadual por três vezes, e no dizer do deputado Álvaro Gaudêncio Neto: “As
suas ideias liberais e seu idealismo político levou-o a ser perseguido pelo
movimento revolucionário” (NETO: 1996).
Humberto Lucena, em pronunciamento no Senado Federal,
chegou a afirmar que “Chico Souto defendeu com ardor, sobretudo, os direitos
dos trabalhadores rurais, particularmente ao tempo da criação, na Paraíba e em
todo o Nordeste, das chamadas Ligas Camponesas, cuja mobilização em favor da
reforma agrária levou ao sacrifício tantos camponeses, como, no caso do meu
Estado, o Nego Fuba, o João Pedro Teixeira e tantos outros, que foram
sacrificados nessa luta” (LUCENA: 1996).
Como podemos perceber, o
deputado esperancense era um defensor das Classes Sociais, tendo lutado de
forma incansável pelos interesses nacionais, a reforma agrária e a questão do
petróleo por entender que neles estavam não apenas os interesses do cidadão,
mas da própria nação brasileira.
Rau Ferreira
Referências:
-
COELHO, Nélson. A
tragédia de Mari. Ideia: 2004.
-
LUCENA, Humberto. Pronunciamento
em 13 de agosto. Anais do Senado
Federal. Brasília/DF: 1996.
-
NETO, Álvaro Gaudêncio. Discurso. Discurso
na tribuna. Diário da Câmara
dos Deputados. Ano LI - N° 146, Sessão de 09 de agosto. Brasília/DF: 1996.
-
NUNES, Paulo Giovani Antonino, [et al.]. Comissão Estadual da Verdade e da Preservação
da Memória do Estado da Paraíba. Relatório
final. A União. João Pesso/PB:
2017.
-
O NORTE, Jornal. A
presença de Chico Souto. Texto
de João Manoel de Carvalho. Edição de 09 de agosto. João Pessoa/PB: 1996.
-
SANTOS, Maria Clyvia Martins (dos). A
tragédia de Mari: resistência camponesa no Município de Mari-PB em 1964. Universidade Federal da Paraíba. Pós-Graduação em
Geografia. Dissertação de Mestrado. João Pessoa/PB: 2017.
- SANTOS, Maria Clyvia Martins (dos). SILVA, Josilena Oliveira Targino (da). A tragédia de Mari em 1964: Tragédia e resistência camponesa no campo paraibano. Singa2017. Geografia das Redes de Mobilização Social da América Latina. Curitiba/PR: 2017, disponível em https://singa2017.files.wordpress.com/2017/12/gt07_resumoexpandido_1506908885_arquivo_clyvia_resumoexpandidosinga2017.pdf, acesso em 18/02/2021.
- SOBREIRA, Dmitri da Silva Bichara. Repressão ao parlamento: as cassações de mandatos arenistas em 1969. Faces de Clio. Revista Discente do Programa de Pós-Gratuação em História – UFJF. ISSN 2359-4489. UFMG: 2018.
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