Falando
dos velhos cantadores, lembrou-me o colega Arimatéia de seu tempo de criança,
na casa deu seu pai Zé Anísio, onde se reuniam diversos repentistas, nas tardes
ensolaradas de Esperança. Narrou alguns casos vividos, outros conhecidos, que
nos remetem a esta arte secular de fazer versos populares.
José
de Arimatéa Valentim, antes de ser Oficial de Justiça, por sinal um dos mais
respeitados desta Comarca de Esperança, admirado por todos os que fazem o
judiciário local, foi comerciante, comprando e revendendo bijuterias, e também
proprietário de um bar, no beco de Mané Jesuíno.
Assim
falou de Arnaldo Cipriano, cantador repentista do qual me referi no artigo
anterior, e sabia de cor as duas primeiras estrofes do acidente da usina de
Pilões, que vitimou muitos esperancenses que se diriam aquela feira, aqui
citados:
“No dia 13 de novembro
Amanheceu uma neblina
O ar do tempo escaroso
Fedendo a carnificina
Como que anunciava
Que um caminhão virava
De Esperança para a usina.
É de cinco prás cinco e meia
Sr. Joaquim Mariano em seu caminhão saia
Pegando gente em Esperança e São Miguel
Atendendo a freguesia”.
(Arnaldo
Supriano, cordel Acidente na usina)
Disse
ter conhecido Zé Nequinho, que era um poeta cego, cantador de romance, que se
apresentava na porta do mercado público. A sua filha declamava-lhe os versos,
que o poeta decorava para cantar nas feiras.
Certa
feita, alguém comentou na praça:
- Seu
Nequim fez a barba sozinho!
E um anão metido a sabido, logo perguntou:
- Ué,
sem espelho?
- E o
espelho adiantava de alguma coisa -, um outro respondeu.
Todos
caíram na gargalhada, qual seria a utilidade de um espelho para um cego.
Nequinho
tinha uma irmã que também era cantadora, mas essa não morava em Esperança,
residia fora, embora viesse aqui em visita, cantando muitas vezes com o irmão.
Uma outra cantadora, já citada por esse pesquisador, foi Terezinha Tietre, que
residiu algum tempo em Esperança.
Em
Timbaúba, zona rural de Esperança, tinha um cantador da família Jesuíno, Damião
repentista. Ulisses Claudino, morador do Sítio Timbaúba, era cantador de coco,
muito afamado na região. Serrador e Eramos também cantaram muito por essas
paragens, esses paraibanos ilustres já consagrados na poesia.
Na
época que Arimatéa possuía o bar, chegou um dia Zé Costa o pintor, que também
trabalhava com imagens, fazendo os reparos dos santos da igreja matriz, tirando
Ari do sério:
- Você
é poeta, tirando o E!
Arimatéa
que sabia alguns versos de cor, respondeu de rompante:
- Sou Patativa do Norte
Poeta do Assaré
Sou homem, não sou mulher
Sua mãe é que pode ser
Poeta tirando o E.
Aconteceu,
também, de um cidadão desses metido a “arrochado”, entrando no seu comércio
para tomar uma “bicada”, deflagrar os seguintes versos:
Perdi a chave da casa
E a mulher me deixou
A polícia daqui é “merda”
E eu não sei onde eu tô.
Um
policial que estava num canto do bar, levantando-se deu-lhe um tapa no ouvido,
caindo o desavisado freguês no chão, mas sem perder o repente:
Achei a chave da casa
E a mulher já voltou
A polícia daqui é “jóia”
Agora sei onde eu tô.
Por fim,
o dileto meirinho falou-me de dois cantadores, os irmãos Manoel e Enésio
Soares, naturais do Riachão da Boa Vista, hoje Município próximo a Campina
Grande, que eram casados com duas irmãs, filhas de Esperança, irmãs de Zé
Soldado.
Joaquim
– o pai delas – passava muito na porta de Zé Anísio, não perdia uma cantoria,
chegando mesmo a levar um radinho de pilha no bizaco, principalmente quando os
cantadores eram seus genros, que muitas vezes se apresentavam na Rádio
Borborema, no programa “Retalhos do Sertão”.
Eis o
registro desses imortais poetas, que marcaram presença neste Município, que é
“celeiro de cantadores”, e alguns “causos” que a tradição popular tem copilado
ao longo do tempo.
Rau Ferreira
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