Por
Júlio César (*)
Irmã Lúcia
Quando cheguei a Esperança em 1982, meus pais
logo trataram de me matricular na Escola Paroquial Nossa Senhora Auxiliadora.
Na época, segundo falara a minha família, a escola era a maior referência de
ensino da cidade. Logo descobri porque, o local era administrado por freiras e
entre elas havia uma que se destacava muito, tratava-se da irmã Lúcia.
Lembro-me vagamente da primeira vez que a vi,
era uma mulher magra, branca e de olhos bem azuis, também tinha uma maneira
engraçada de falar que me fazia conter o riso. Depois me falaram que ela era
holandesa e por isso falava daquele jeito, como se no final de cada palavra
tivesse um zumbido semelhante a um leve assobio, como se o som escapasse entre
os dentes.
Mas, independente deste lado, que para mim
parecia ser cômico, irmã Lúcia era uma pessoa muito dedicada a aquela
instituição de ensino e principalmente aos alunos. Mesmo garoto eu percebia
essa preocupação dela. A irmã fazia questão de ficar na entrada da escola ao
lado de outras freiras para receber os alunos, alguns professores também
ficavam essa atitude para mim era algo completamente novo, pois jamais em
outras escolas que estudei as pessoas vinham nos recepcionar, era uma atitude
que me fazia se sentir importante.
Apesar de rigorosa em alguns momentos a irmã
nutria certa admiração coletiva entre os alunos. As turmas ficavam perfiladas
na atual praça da cultura, em frente à escola, e as freiras anunciava a turma
que deveria entrar. Parece engraçado, mas, foi assim por um bom tempo e todos
ficavam naquela expectativa de ser chamado por Lúcia só para receber o toque de
carinho que ela dava na cabeça de cada aluno que passava junto a ela, aquele
ato era como uma benção.
Antes de se dar inicio a aula havia duas
cerimônias que eram praticamente obrigatórias acontecer. Às vezes, éramos
perfilados no pátio interno para fazer uma oração para a imagem de Nossa
Senhora que existia envolto numa caixa de vidro (Não sei se essa imagem ainda
existe). Quando não, ao entrar na sala de aula, ficávamos todos de pé em suas
carteiras e as aulas sempre eram antecedidas por duas orações, a Ave Maria e o
Pai Nosso, para só depois então começar a aula.
Quanto ao lado rigoroso, a irmã cobrava muito
a questão de higiene principalmente no uniforme, tanto que era comum aluno ter
duas camisas da escola. Havia até uma espécie de inspetoria não oficial entre
as freiras para saber quem estava com seu uniforme “alinhado” ou não. Tanta
observação gerava entre os alunos vários mitos, um deles afirmava que as
freiras chegavam a dar banho nos alunos que chegavam sujos a escola. Outro que
os alunos com uniformes sujos eram mandados para casa. Mas, era tudo mito de
criança.
Na verdade, soube depois que as irmãs até
davam uniforme para quem não pudesse comprar, pois a cada fim de período
escolar era realizada uma campanha de doação de uniforme velho, ou de alunos
que não voltariam a estudar lá, para alunos carentes.
Quando a irmã adoecia, ou ia visitar seus
parentes na Holanda, era um comentário só na escola, cansei de ver
principalmente as alunas irem à secretária e perguntarem; “irmã fulano, como
está irmã Lúcia, ela volta logo?” e quando a irmã voltava era um misto de
alegria, mas também de receio, pois seu retorno também significava que o “relaxamento”
na escola havia acabado.
Quando deixei a escola paroquial o meu
primeiro choque na nova instituição de ensino foi perceber que em nenhum outro
local de estudo receberia aquela atenção que me fazia se sentir importante. Lá,
me ensinaram que o conhecimento era o maior bem que um ser humano podia ter na
vida. Com os anos verifiquei que o meu receio era na verdade uma triste
realidade no Brasil, pois fora dos muros da velha Escola Paroquial Nossa
Senhora Auxiliadora, nenhuma das escolas que passei, até chegar a me formar em
jornalismo, teve tanta preocupação com o aluno e o ensino quanto a “escola das
freiras”. Obrigado irmã Lúcia!
Por
Júlio César (*)
(*)
Cartunista e pesquisador, atualmente desenvolve um projeto que finalizará em
2014 com a publicação de um livro sobre o futebol paraibano.
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