Chegou-me, pelas mãos de Jorge Rezende, a cópia de uma carta escrita pelo poeta Silvino Olavo (1897-1969) e dirigida ao então Senador José Américo de Almeida (1887-1980). A peça pertence ao acervo da Fundação que tem o seu patronato e se encontra arquivada naquela casa de memória.
Na data de sua escrita - 20 de maio de 1935 -, não fazia muito tempo que
Zé Américo havia se exonerado do Ministério de Viação e Obras (1934) para
candidatar-se ao Senado Federal, e sagrando-se vencedor naquelas eleições,
assumia o cargo por apenas três meses, para pouco depois, ser indicado ao
Tribunal de Contas da União (1935), pelo presidente Getúlio Vargas (1882-1954).
Ao passo que Silvino ocupava a ala “Clifford Beer” de pensionistas
internos da Colônia “Juliano Moreira”, na Capital paraibana. No hospital
dirigido por Onildo Leal, o poeta era assistido pelo Dr. Gonçalves Fernandes,
com alguma liberdade.
O seu nome ainda aparecia no cenário nacional. O jornal "O
Estado" de Santa Catarina publicava os seus versos, enquanto que a revista
"Fon-Fon" enaltecia o autor de “Cysnes” (1924) e “Sombra Iluminada”
(1927). Não obstante um certo distanciamento das lides literárias, prefaciou
“Misérias” (1935) do confrade Leonel Coêlho.
“Li seu novo romance: Boqueirão” - escreve Olavo para Zé Américo -,
comparando a obra a “Carrilhão de Símbolos”, de Euclides da Cunha, que havia
lido no Jornal do Commercio no dia 03 de abril daquele mesmo ano.
O livro de Almeida é todo ambientado nas personagens e conta o drama
social da sua gente, verdadeiros protagonistas desta saga nordestina.
Em um trecho inicial de sua resenha, lê-se que “Há, poder-se-á dizer,
simultaneísmo e meditações, quando não de feitura, em ambos. Com u’a
impregnação aterradora” elevado “a um nível sem nível de águas
diluvianas, não é – por que não pode ser – a terra que não tem alma”.
Para ele, o “Boqueirão” (1935) estava à altura de uma “separata de La
Cor”, tal qual “A Bagaceira” (1928), considerada a sua obra-prima, da qual
já nos debruçamos, nesta mesma coluna “Janelas da História”.
Olavo conclui o seu “fado”:
“Errado
ou certo, quer dizer: pessoal ou impessoal, é esta por vez ou não de tudo
facilitar-se o Brasil, é esta a rude compreensão que me houve de inspirar a
atualidade de ambiente (...) na continuidade desse estado em que tiramos
‘a casa universal’...!”
José Américo – na ótica de Silvino – era “um ideal de saúde”, pois
tomado pelo turbilhão de acontecimentos da “Revolução de 1930”, caíra o poeta
em dor profunda, pelo súbito passamento de João Pessoa Cavalcanti de
Albuquerque (1878-1930).
Raul de Góes assim descreve esses fatos, demonstrando surpresa, pois nada
no amigo antevia qualquer sinal de distúrbio:
“(...) revelando
no sorriso franco uma índole forte, generosa e cavalheiresca, nada em Silvino
Olavo, nenhuma alteração em seus hábitos e maneiras deixava entrever ou
perceber que irremediável insanidade estava minando as suas faculdades mentais.
Foi, portanto, com verdadeira estupefação e doloroso pesar que os seus íntimos
e a sociedade paraibana tomaram conhecimento de que aquele cérebro privilegiado
dera sinais de profundo desequilíbrio”.
Com efeito, atuara ele na vida política da Paraíba, engajando-se em
eleger João Pessoa, participando dos comícios da “Aliança Liberal”, na companhia
de Manoel Paiva, Osias Gomes e Mário Campello.
Olavo era o seu chefe de gabinete, quando naquele fatídico dia, viajou o
presidente da Parahyba para o Recife e o resultado desta incursão todos nós
sabemos...
Antes participara do governo João Suassuna (1886-1930), na condição de
assistente e 1º Promotor da Capital do Estado, e juntamente com José Américo de
Almeida, que também era o seu padrinho de casamento, compunha o Conselho
Penitenciário Estadual.
Certa feita, reunira-se no Clube dos Diários com o diretor e redatores
d’A União, para uma “ágape que decorreu na mais ampla cordialidade”. Na
oportunidade, disse Zé Américo que era a hora do “ser ou do não ser”,
referindo-se à “finalidade histórica”.
Almeida, ao reverso de Silvino, soube lidar melhor com as emoções vividas
naqueles dias de tumulto na Parahyba. Também soube aproveitar o momento para
galgar um cargo político e, mais adiante, um ministério vitalício.
Olavo ainda ansiava pela ajuda do ex-colega de governo, pois escreve a Zé
Américo: “ando sonhando suas divinais providências!... Ainda em
estado desordenado de saúde, vivo esperando dias prometidos”.
Silvino não era um interno qualquer do “Juliano Moreira”, podia sair e
dar seus passeios. O seu pai era proprietário de uma fazenda em Barra de Santa
Rosa (A União, 31/01/1930). Talvez por isso a carta tenha sido escrita deste
município. Ele encerra a missiva à José Américo com “Abraços de admirador e
amigo”.
Rau
Ferreira
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