Silvino Olavo começou
a apresentar sintomas de sua doença em julho de 1929. Na época, não havia
qualquer inclinação à loucura, sendo tais casos tratados como “crise de nervos”.
Dizia-se “atacado
de ligeiro incômodo”, reservando-se no Pilar, onde residia a sua noiva. Em carta
a Epitacinho, João Pessoa que ele foi em vésperas de São João para o Engenho Recreio
daquela cidade.
O seu estado se
agravara em dezembro do mesmo ano, quando ao desembarcar do “Flândia”, um navio
holandês, que partira do Recife com destino ao Rio, apresentou um gesto
inusitado.
O seu biógrafo
João de Deus Maurício comenta o seguinte:
“Quando o navio atracou no porto e
foi lançada a escada para o desembarque dos passageiros, o Presidente João
Pessoa foi o primeiro a descer, e ficou à beira do cais, esperando pelo seu
auxiliar. De repente, apareceu Silvino, conduzindo a maleta na cabeça. Este seu
comportamento causou certa estranheza ao Presidente e observada por vários
amigos que se encontravam no local.
Depois das apresentações,
ambos foram para o hotel. No dia seguinte, Silvino amanheceu muito nervoso, com
visíveis sinais de grave deficiência mental. Levado a uma clínica
especializada, foi então diagnosticado que o quadro clínico se mostrava
progressivo, sendo necessário o internamente, para tratamento”.
Na ocasião, o
poeta acompanhava o presidente João Pessoa, que participaria da Convenção
Nacional da Aliança Liberal, ponto inicial da candidatura à vice presidência da
República, na chapa encabeçada por Getúlio Vargas.
Após os fatos que
eclodiram com o assassinato do governador paraibano, foi internado em
definitivo no hospital de alienados em Recife, o famoso “Tamarineira”, o qual não
passava de um “simples depósito de doentes mentais” (Unigraf: 1992, p.
16).
Naquele nosocômio,
passou a ser acompanhado pelo clínico Dr. Gonçalves Fernandes, que observou
aspectos de seu comportamento, documentado em crônicas e poemas. Esse estudo
lhe valeu a publicação do artigo “As produções artísticas entre os
schizophrenicos da Tamarineira” na Revista Medicina.
Por sua condição
social elevada, e seu intelecto de projeção nacional, gozava Silvino de certas
regalias, dentre elas acesso a livros e papeis nos quais em crônicas e poemas revelava
a sua vida interior.
Assim escreve o
Dr. Gonçalves Fernandes sobre o paciente “S.O. da C”:
“[...] no autismo que lhe permite
aquela satisfação concedida pelo meio ambiente para satisfação única do impulso
inconsciente [...] saída compensadora de emoções íntimas, [...] uma sinceridade
que não se duvida: um sentimento poético que está livre de condições que não as
do seu mundo afetivo. [...] em páginas de livros, como se fossem anotações. Sua
grafia é, no entanto, bem legível, letra de talhe firme; expressões imprevistas
que nos atordoam a cada momento nos seus escritos.
Em sua anamnese,
ainda acrescenta o pesquisador as suas impressões sobre Silvino Olavo:
“Fala com ar de ironia, leve sorriso
nos lábios. Fala sobre seus versos e opinião de alguns críticos, tudo muito dissociadamente,
sem encadeamento lógico, por vezes reticente. [...] ambivalente. [...] Diz-se
individualista e místico, e conclui dizendo nada ter de místico nem de
individualista”.
Permaneceu
internado, no Recife, até a sua interdição, declarada por sentença do Dr.
Belino Souto, juiz da Capital paraibana, quando então fora transferido para a Colônia
“Juliano Moreira”, em João Pessoa.
Assim passou a
ocupar o Sanatório “Clifford Beer” de pensionistas, construído em 1935, na
administração de Argemiro de Figueiredo, dirigida por Onildo Leal, sendo
assistido, também na Paraíba, pelo Dr. Gonçalves Fernandes. Ali permaneceu por
quase duas décadas, porém com maior liberdade, inclusive na produção textual.
Segundo Maurício: “A Justiça o privara de reger os seus bens, mas não lhe
tirou a genialidade literária” (Unigraf: 1992, p. 48).
O escritor Eduardo Martins, autor de sua obra
poética, comenta que: “Nos cinco primeiros anos de sua obtenção de alta do
Sanatório, no dia 12 de junho de 1952, manteve-se Silvino Olavo com seu estado
clínico inalterado, passando então a demonstrar sensíveis melhoras, chegando a
viver socialmente em sua cidade – segundo depoimento de seus familiares -, palestrando
com amigos, sem deixar transparecer nenhum sinal de desequilíbrio mental”.
De fato, isso podia ser constatado em sua
caminhada matinal, pois tão logo acordara, seguia de carro com motorista
próprio para o bar do primo, em frente a igreja local, onde tomava seu café e
permanecia por algum tempo lendo o jornal.
Dessa fase de sua vida extrai-se dois momentos
inusitados. Certa feita um cachorro, de nome “Tucano”, colocou a cabeça entre
as pernas do poeta. A turma de motoristas da praça de táxi, em forma de gracejo,
gritou em tom de galhofa: - Doutor, o senhor gosta de cachorro? Ao que lhe respondeu: “Gosto
porque tem cachorro amigo e muito amigo cachorro”, recitando ainda os
versos do seu poema “Amigos”: “Todos dizem amigos verdadeiros, mas somente nos
tempos de prosperidade”.
Um outro fato aconteceu com o acadêmico de Direito
Paulo Coêlho da Nóbrega, que ao se aproximar de Silvino, pediu que lhe
ensinasse uma matéria para o próximo exame. Apesar da insistência do rapaz,
Silvino continuava ser dar palavras, por fim retrucou o estudante: - Ensima-me seu
doutor burro. Olavo encarou-o com certo ímpeto, e retrucou: “não admiro
um doutor burro. Admiro um burro querendo ser doutor”.
Abandonado pelos amigos, e longe da vida intelectual,
ainda assim escrevia, de sua terra natal, chegando a anunciar um novo livro “A
harmonia das esferas”.
Rau Ferreira
Referências:
- MARTINS. Eduardo. Obra poética. Silvino Olavo. Mídia Gráfica e
Editora. João Pessoa/PB: 2018.
- MAURÍCIO, João de Deus. A vida dramática de Silvino Olavo. Unigraf. João
Pessoa/PB: 1992.
- MEDICINA, Revista da Sociedade de Medicina da Paraíba. Ano V, Nºs 2 e
3. As
produções artísticas entre os schhizophrenicos da Tamarineira, texto de Gonçalves
Fernandes. João Pessoa/PB: 1936.
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