Excursionara o Presidente João Pessoa ao interior do
Estado. O objetivo era agradecer, antes das eleições de 1º de março, a representação
recebida na Capital. Em nove dias visitara 36 municípios. Ao final foi à
Princesa, reduto do Coronel José Pereira. O ano era 1930.
A questão tributária, por mais que nos afastemos
desta ideia, se projetara como premonição do que estava por acontecer. Apesar de
ser informado pelo Tenente Arruda, então delegado do lugar, o presidente não
deu crédito. As tratativas foram cordiais, entretanto a desconfiança pairava no
ar.
Passou o governante apenas um dia em Princesa. Acompanhava-o
Elysio Sobreira no comando da força militar, Antenor Navarro e José Américo de
Almeida. Nessa viagem, comentara o autor d’A Bagaceira que o coronel Sobreira, ajudante
de ordens do governo, tinha o “bigode retorcido e o olho vivo”, denotando certa
desconfiança; e não se recostava no automóvel, enquanto Almeida (como todo bom
Nordestino) se esparramava no veículo.
Houve discurso na praça principal e um banquete para
cinquenta pessoas na casa do coronel por volta das 10 horas da noite. Seguiu-se
a um animado baile, que por volta da meia-noite, foi mudado para uma casa em
frente, pois o presidente precisava descanso. A dança foi até às três da
madrugada.
O retorno para a Capital estava marcado para as
cinco, mas atrasou devido ao café da manhã, servido na mesa do banquete,
observando-se que todos se sentassem na mesma colocação do dia anterior.
A conversa daquela manhã de 20 de fevereiro foi
cordial. O presidente esboçava bom humor, pilheriando acerca do apetito do Sr.
José Américo de Almeida; adentrando no assunto – que não podia ser outro –
senão a política.
Antenor Navarro que a tudo assistiu, como “repórter
que fomos da viagem”, disse que João Pessoa falou abertamente que “se
acreditasse em mexericos, não estaria ali em Princesa”.
A partir daí, a conversa rumou para a campanha liberal,
cujas chamas e procurações haviam sido confiadas pelo Coronel Elysio Sobreira
ao Professor Feitosa para as eleições que se avizinhavam.
José Pereira reafirmara o apoio ao presidente e, em
dado momento, Elysio o convidou para seguir com a comitiva até Misericórdia, recusando-o,
porém, a pretexto de ser véspera de eleição, e que havia muito trabalho para
fazer. Na oportunidade, alguém até insistiu, dizendo:
- Você poderia até ajudar a consertar a situação de
Piancó, com seu prestígio de chefe sertanejo...
E comenta Navarro que José Pereira riu satisfeito:
- Não é necessário. Que poderei fazer eu diante do
presidente? Basta a sua presença...
A saída aconteceu por volta das 7 da manhã, certos
da solidariedade, que só veio trazer dúvidas, após um incidente no caminho para
Teixeira. Um automóvel veio em sentido contrário. Os dois carros pararam. Os ocupantes
ficaram tão surpresos ao verem João Pessoa que não puderem esconder o espanto. Despediram-se
rapidamente.
Correram rumores de desafetos, palavras descorteses ao
anfitrião, que teriam sido propaladas por João Pessoa. O presidente assim
relatou o ocorrido para o Diário da Manhã, jornal do Recife:
“Fo precisamente quando me encontrava na capital que
recebi um telegrama do sr. José Pereira rompendo com o Partido. Alegava ele,
que posteriormente à minha saída de Princesa, fora informado, por ‘pessoa que não
mente’, de terem sido feitas referências desabonadoras ao seu nome na Comissão
Executiva do Partido, por ocasião da escolha dos nossos candidatos às eleições federais.
Estranhei de tal maneira o que se referia no
telegrama. Pedi por isso confirmação. E em face dos termos descorteses do
segundo despacho, confirmando o primeiro, respondi como devia responder.
A ‘pessoa que não mente’, aludida no telegrama que me
pareceu apócrifo à primeira vista, teria sido necessariamente o sr. João
Suassuna. É o que concluo das vacilações, por assim dizer, çanicas, com que
dois irmãos do ex-presidente, deparando-me em caminho, quando regressava de
Princesa, à capital do Estado, cumprimentaram-me evidentemente desconcertados,
dirigindo-se para o reduto do sr. José Pereira”.
Foi naquela visita à Princesa, que segundo se
comenta, o quarto onde o presidente se hospedou e dormiu ficou trancado por
fora.
Em campanha, alguns dias depois, retorna João Pessoa
com a intenção de concluir as suas visitas. Vai ao sertão. Após passar por
algumas cidades, chegou à Santa Luzia. Demorou-se um pouco, saiu à tardinha.
Teve que atravessar o Rio Grande do Norte em Serra
Negra, quando ia de Santa Luzia a Brejo do Cruz. Foram impedidos por um rio. Precisavam
esperar o carro da bagagem e que trazia as chapas eleitorais, com medo que se
molhassem. Subiram à outra margem, junto à igreja principal, na entrada da
cidade, onde havia uma porteira.
Ao aproximar o carro dez soldados tomaram posições. Uns
em posição de sentido, outros segurando o fuzil e um sargento junto à porteira –
que permanecia fechada – e descendo o Coronel Elysio Sobreira, o graduado que
dominava a cancela fez sinal para abrirem, foi quando o auto passou,
cumprimentando-os; e mais adiante, um tenente à calçada da igreja fez continência.
É que corriam boatos de que o presidente estaria
acompanhado da “força da Polícia, para invadir o Rio Grande do Norte”, o
que só vieram a saber em São João do Sabugi.
Vencido nas eleições pelo candidato de Washington
Luiz seguiu-se um movimento contrário e repentino dos quais todos conhecem.
O certo é que Elysio Sobreira liderou o combate à Princesa
que durou cerca de 13 horas. Foram acirradas lutas, com notícias de ferimento à
bala em Nova Olinda, de onde saiu gravemente ferido.
Dias antes, em entrevista para o jornal “O Globo”, o
Coronel Sobreira afirmara que os seus homens tinham indescritível entusiasmo e
que considerava uma luta fácil “dada a bravura dos oficiais, inferiores e
praças da nossa Força Pública”.
Rau Ferreira
Referência:
-
ALMEIDA, José Américo de. O ano do Négo: (memórias). A União. João
Pessoa/PB: 1978.
-
DIÁRIO DA MANHÃ, Jornal. Edição de 1º de março. Recife/PE: 1930.
-
O GLOBO, Jornal. Edições de 06 e 19 de maio. Rio de Janeiro/RJ: 1930.
-
R.IHGP. Apontamentos para a história da revolução pelo Dr. Antenor Navarro. Vol.
VII, Nº 452. Imprensa Official. João Pessoa/PB: 1932.
-
VIDAL, Ademar. O incrível João Pessoa. Parahyba do Norte: 1931.
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