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Silvino Olavo e José Gaudêncio: Parceria jornalística


José Gaudêncio (1930)
O Jornal era um periódico que se publicava na Paraíba nos anos 20 do Século passado, sob a direção de Joaquim Pessoa C. de Albuquerque e gerenciado por Francisco Coutinho de Lima e Moura.
Iniciado em 1923, possuía circulação diária, trazendo já na primeira página o lema de Joaquim Murtinho: "É necessário republicanizar a República".
Com a ascensão de João Suassuna ao governo do Estado (1924/1928) houve uma mudança no seu quadro, passando aquele folhetim a ser dirigido por José Gaudêncio Correia de Queiroz.
Gaudêncio assumiu a condução do jornal no final de 1925, dando-lhe nova roupagem segundo as diretrizes da política paraibana.
Em matéria de 17 de janeiro de 1926, publicava "A União" a nova fase deste noticiário, que seria inaugurada em fevereiro daquele ano “de modo a satisfazer os interesses do público”.
Na época, o folhetim havia adquirido um novo prelo, do tipo “Marinoni”, com dupla expulsão automática. A aquisição desta máquina assegurava “em condições eficientes, uma vultosa e fácil tiragem”. 
E conclui a matéria: “Reina uma simpática expectativa em torno da nova fase deste órgão da nossa imprensa, que circulará dentro em breve, sob a direção política e intelectual dos drs. José Gaudêncio e Silvino Olavo”
Por esse tempo Silvino Olavo havia concluído o seu bacharelado, pela Faculdade de Direito do Rio de Janeiro, retornou o poeta ao seu berço natal, laureado pela crítica nacional com a publicação de seu "Cysnes" (1924).
Gozando de privilégios com o novo estadista, foi nomeado Promotor Público da Capital e, em pouco tempo, era convidado por José Gaudêncio para chefiar a redação d'O Jornal com liberdade para constituir o seu corpo de redatores.
Em entrevista para o jornal A Crítica/RJ, José Gaudêncio nos lembra que "(...) quando diretor de O jornal eu lancei o nome de Silvino Olavo, que foi redator-chefe daquele matutino (...). E hoje eu louvo-o como o poeta de Cysnes".
Silvino o considerava como amigo, tanto que lhe dedicou um de seus poemas, louvando-o como "alma de renúncia e de bondade", denotando não apenas o desprendimento de José Gaudêncio, como a sua personalidade na qual ressaltava o bom caráter. 
A título de ilustração, reproduzimos o poema “Lâmpada triste”:
Pobre Lâmpada Triste, evocatória,
que alumiaste a minha adolescência,
já vais morrendo no ermo da memória,
vais-te apagando em minha consciência.
Não quis mais acender-te a chama flórea

de mansa e generosa opalescência...
E a ingratidão que te fez triste e inglória
amargurou-me o resto da existência!

Naquela encruzilhada – entre menino
e moço – em que se é presa do desejo,
da ambição de sonhar melhor destino.

sonhei demais... E, assim como previste,
tudo falhou-se, tudo! e hoje é que vejo
que o meu sonho eras tu – Lâmpada Triste!

Silvino Olavo

O grupo selecionado por Olavo era composto por José Gaudêncio, Edésio Silva, Alves Ayres, Eudes Barros, Orris Barbosa, José Tavares e Samuel Duarte. Eles se congregavam no sobrado da Rua Direita (Rua Duque de Caxias), nº 555 e durante dois anos reescreveram a história da Paraíba.
Com essa linha de redatores, em pouco tempo aquele folhetim se destacavam na Paraíba. O Diário de Pernambuco em nota publicada na edição de 22 de junho de 1926, igualmente chamava a atenção para “O Jornal”, seu diretor e redator-chefe:

"O Dr. José Gaudêncio, advogado de nota e político de largo prestígio na Parahyba e o Dr. Silvino Olavo, Promotor Público na Capital e figura das mais cintilantes das novas letras da Filipéia, tiveram a fineza de sua visita pessoal à redação desta folha"

É o próprio Silvino que confessa: "E assim vivêramos nós o melhor período da nossa vida de letras e de lutas, entre o brilho de Eudes e Orris, as aparições de Samuel e a assiduidade de Peryllo Doliveira. (...) Ninguém brigava nem se traía. Era uma só cordialidade comovente naquele reinado espiritual e fraterno de juventude triunfadoras obedientes às aspirações do nosso povo" (A União: 1931).
Foram tempos de grande efusão, com a publicação de matérias jornalísticas e de cultura que elevaram a Paraíba a patamares nunca antes imaginados, destacando-se na mídia nacional através de José Américo de Almeida, Silvino Olavo, Eudes Barros e Peryllo Doliveira que publicaram seus livros com grande aceitação nacional.
O jornal “O Globo”, em menção honrosa, destacou a importância d’O Jornal em seu quinto aniversário:

“O 5º aniversário d’O Jornal, da Paraíba do Norte – A evolução do jornalismo nos vários Estados da federação é bem um índice da mentalidade das populações do  interior. Cidades que mal sustentavam um jornal diário, contam, hoje, com dois, três e quatro órgãos de grande atuação e irradiação em que si todos os pontos populosos do país. Agora mesmo temos em mão o número de aniversário brilhante matutino ‘O Jornal’ que se edita na capital paraibana sob a competente direção dos nossos colegas Drs. José Gaudêncio e Silvino Olavo” (O Globo: 18/05/1927).

Depois d’O Jornal, Gaudêncio já tinha experiência jornalística, foi diretor político do “Diário da Parahyba”, cujas oficinas funcionavam na Rua Duque de Caxias, nº 255.
José Gaudêncio é natural de São João do Cariri, nascido em 1881, bacharel em Direito pela Faculdade do Recife/PE, atuando na política e nas ciências jurídicas, ocupando os cargos de Procurador Geral do Estado, Professor Universitário e Advogado; foi também jornalista e Diretor d’O Jornal. Elegeu-se Deputado Federal e Senador da República.
A sua vida e a sua carreira foram brilhantemente descritas pelo seu sobrinho-neto Flávio Ramalho de Brito no livro “Um político da República Velha”, lançado em 2017.

Rau Ferreira

Referências:

- OLAVO, Silvino. Criadores e criaturas. A União. Parahyba do Norte: 1931.Como é sabido, o poeta Silvino Olavo colaborava com diversos jornais e periódicos da Paraíba e de outros Estados, o que fazia valendo-se da correspondência epistolar. Dentre eles, destacamos “O Jornal”.

- BATISTA, Simone Vieira. A trajetória intelectual de Silvino Olavo: Uma análise histórica, cultural e educacional. UFPB. Programa de Pós-Graduação em Educação. Jean Carlo de Carvalho Costa (Orientador). João Pessoa/PB: 2011.

- FERREIRA, Rau. Silvino Olavo. Edições Banabuyé. Epigraf. Esperança/PB: 2010.

- LAEMMERT, Almanak. Seção Parahyba. Vol. III, Pág. 694. Rio de Janeiro/RJ: 1930.

- ARAÚJO, Maria de Fátima. Paraíba, imprensa e vida: jornalismo impresso 1826 a 1986. 2ª ed. Revista e atualizada. João Pessoa/PB: 1986.

- MAURÍCIO, João de Deus. A vida dramática de Silvino Olavo. Unigraf. João Pessoa/PB: 1992.


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