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Negócio desmantelado: A mulher paciente

Esperança é povoada de “causos”, contos e narrativas populares que são passados de geração em geração com certa parcimônia. Não obstante, cada cidadão tem uma estória para contar.
Esta que ora se apresenta foi recolhida em nosso município por Altimar Pimentel em 27 de novembro de 1979. Está no livro “Contos populares: Paraíba”, escrito em co-autoria com Osvaldo Meira Trigueiro (Editora Massangana: 1996), que passo a adaptar para melhor compreensão do leitor, mantendo incógnito o nome das personagens:
Um esperancense comparecendo a feira fez uma troca desmantelada, trocou uma vaca num galo, e o galo por um pão. Um camarada que acompanhara aquela empreitada deu azo a que sua esposa sabendo desse negócio, contrariada iria lhe dar uma sova.
No que respondeu o companheiro:
- Que nada, minha mulher nunca brigou comigo e não será dessa vez.
- Olha Fulano, que hoje Maria vai te dar uma surra.
- Minha esposa é paciente, vai entender. Olha, faço até uma aposta que tudo terminará na melhor forma possível.
- Pois bem – respondeu o amigo – quero é mesmo ver!
- Vou para casa, e você fica escondido ouvindo a conversa. Se perder a aposta, perco a minha casa prá você.
Apertou as mãos como sinal de confiança, fechando aquele trato.
O fulano chegou em casa, foi bem recebido pela mulher que armando a rede lhe pôs para deitar, sorvendo-lhe um beijo amoroso. O compadre se escondera na varanda atento a tudo que se passara. Nesse momento, a mulher perguntou-lhe “Fez bom negócio, marido?”.
- Fiz sim, mulher. Muito bom negócio.
- Você vendeu a vaca?
- Maria vendi não! Troquei a vaca por um carneiro, que tu achas?
- Ora, marido. Melhor assim, porque o carneiro agente vende a carne, tira o couro e manda curtir; assim terei um “courinho” pra sentar quando for fazer minhas rendas! Mas cadê o carneiro?
- Ora, pois. Troquei o carneiro num porco!
- Ah meu filho, que bom. O porco agente fez o toucinho, come a carne que é coisa boa. E onde tá o porco, que eu quero por para cevar?
- Querida, troquei o porco num galo!
- Vixe, e onde tá o galo?!
- Mulher, eu não te conto. Nessa viagem parei na casa de uma mulher bem pobrezinha, que me deu um prato de feijão. O feijão me ofendeu, foi quando ela disse que iria me dar um purgante, mas não podia porque não tinha carne para fazer um caldo. Pegamos então o galo, que ela matou e depois com a carne fez o caldo foi quando fiquei bom.
Ouvindo aquele relato, condoída com a situação do seu consorte, a mulher se abraçou ao marido, finalizando:
- Meu amor, mas vale a sua saúde do que o galo!
Parafraseando Chicó em “O Auto da Compadecida”, de Ariano Suassuna, termino essa minha narrativa dizendo que não sei, não sei se foi verdade, apenas sei que foi assim...

Rau Ferreira

Referências:

- TRIGUEIRO, Osvaldo Meira. Pimentel, Altimar de Alencar. Contos populares: Paraíba. Fundação Joaquim Nabuco. Editora Massangana: 1996.

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