Reportagem especial
Todos
os anos a turma da 4ª Série de Direito da Faculdade do Rio de Janeiro fazia uma
visita à Penitenciária de São Paulo, situada no Carandirú. Ao final daquele tour deviam os alunos apresentarem ao
Professor Cândido Mendes um relato, em cumprimento à disciplina “Métodos
Penitenciários”.
A
viagem se iniciara no dia três de junho de 1923.
Seguiam
em companhia do professor-ministro Alfredo Pinto para “estudar a organização correcional da capital do vizinho Estado (...).
Figura também no programa um passeio
encantador ao porto de Santos” (Gazeta de Notícias: 1923). Eram 39 rapazes a
se aventurarem nas serras e no direito!
O
Ministro da Justiça acometido de um súbito mal-estar foi substituído às pressas
pelo professor Esmeraldino Bandeira.
“A garoa e o progresso espantaram-nos”,
comentou Pedro Calmon em suas memórias. Silvino ficara responsável pela
saudação carioca e, depois da preleção do mestre itinerante, falaria Pedro seu
colega de classe.
“Foi escolhido para orador oficial da turma
itinerante o acadêmico Silvino Olavo da Costa, que, nesse caráter falará na Faculdade
de Direito de São Paulo” (O Imparcial: 1923).
No
programa, organizado pelos estudantes paulistas, constava um espetáculo no
Teatro Apolo, uma visita ao Monumento do Ypiranga e ao Museu Estadual, com
presenças na Faculdade de Direito, Escola do Comércio “Alvares Penteado” e às
obras da Catedral. Ao cair da noite, compareceriam ao governo paulista, onde o
Presidente do Estado lhes aguardava, assim como o secretário de interior. A seguir,
um espetáculo de gala no Teatro Boa Vista dedicado pela “Cia. Léa Candini”.
A
visita ao monumento fora acompanhada pelo engenheiro-chefe Mário Wathely “que lhes deu as explicações necessários”.
Já o Dr. Afonso Taunay, diretor do museu, “mostrou
aos visitantes todas as dependências da repartição ao seu cargo”. Na escola
do comércio acompanhou-os o diretor Horácio Berlink, e na catedral o Dr.
Alexandre de Albuquerque (Correio Paulistano: 1923).
No
dia seguinte, estava prevista a visitação à penitenciária, dirigindo-se os estudantes
de bonde do Largo de S. Bento. À tarde participariam do festival do “Cine
República”, com sessão cinematográfica e chá dançante.
Demorar-se-iam
ainda dois dias em São Paulo, de um total de quatro, constando dos dois
últimos, uma visita a cidade de Santos, cujo transporte fora cedido pelo
superintendente de estradas, Dr. W. Sheldon, com saudação pelo prefeito no balneário
santista e um almoço ofertado aos alunos em companhia da miss Zezé Leone.
Na
sequência, visita às docas, a bolsa oficial do café, monumentos da cidade e ao
túmulo do patriarca José Bonifácio, onde seria colocado uma coroa de flores,
fazendo um ligeiro passeio pelas praças.
No
pátio da prisão os sentenciados ouviam atentamente os discursos proferidos
pelos futuros bacharéis cariocas. Silvino evocava a mais tradicional plêiade de
professores e vultos paulistas, detendo-se, porém, no maior deles, o grande
jurista Ruy Barbosa.
Os
detentos aplaudiam, enquanto o nosso vate confessava o fracasso de sua tíbia
comovida: é que as pernas tremiam, numa ânsia de nervosismo comum a todo aluno
diante de uma plateia indistinta:
“Tenho o fracasso da minha tibieza comovida;
e, para acobertá-la, peço-vos emprestado um pouco do vosso entusiasmo, uma
centelha dessa coragem que me elevará, por um momento, acima de mim mesmo,
trazendo-me à visão da retina alucinada uma porção mais larga de horizonte e uma
nesga de Azul mais constelado”.
Lembrando
a “Oração aos moços”, fazia uma reverência ao seu mestre, já antevendo em sua
preleção a inversão dos valores morais, políticos e sociais que varreriam essa
nação, talvez fruto da decadência europeia e o raiar do Novo-mundo capitalizado
pelo país estadunidense.
E
acentuava em seu discurso: “O que é
preciso é que a política no Brasil seja a ciência dos interesses vitais da
nação, como queria Ruy, o grande, e não essa que é ‘uma constante traição à
consciência política’ (...). Adotemos
o símbolo que é formoso e tem harmonia do prazer e da bondade. Sejamos arvore
boa; e o nosso fruto se multiplique, pela fecundidade da semente e pela
idealidade do perfume”.
Para
Calmon, o melhor do passeio foi conhecer Zezé Leone, “a mais bonita das brasileiras”, a quem ofereceram um “almoço, num
restaurante, que se encheu de curiosos e oradores”, dos quais Silvino
sobressaiu com este dístico: “Só em terra
de Santos/ poderiam surgir os teus encantos”.
A
volta foi de reflexão, não apenas pelo trabalho escolar a ser apresentado, como
pelas anotações que seriam publicadas na revista “Época”, da faculdade de
direito.
Rau
Ferreira
Referência:
- A ÉPOCA. Revista dos
alunos da Faculdade de Direito da Universidade do Rio de Janeiro. Ano XVIII.
Edição de junho. Rio de Janeiro/RJ: 1923.
- CALMON, Pedro. Memórias. Ed. Nova Fronteira. Rio de Janeiro/RJ: 1995.
- CALMON, Pedro. Memórias. Ed. Nova Fronteira. Rio de Janeiro/RJ: 1995.
- CORREIO PAULISTANO,
Jornal. Edição de 05 de junho. São Paulo/SP: 1923.
- FERREIRA, Rau. Silvino Olavo. Epgraf. Esperança/PB:
2010.
- GAZETA DE NOTÍCIAS,
Jornal. Edição de 03 de junho. Rio de Janeiro/RJ: 1923.
- O IMPARCIAL, Jornal.
Edição de 02 de junho. Rio de Janeiro/RJ: 1923.
Grande reportagem em que figura o nosso maior expoente literario Silvino Olavo. E feliz e oportuna publicação. Parabens Rau!
ResponderExcluirExcelente e oportuna reportagem,na qual referencia o nosso expoente e literato maior Silvino Olavo. Parabéns Rau
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