(*) Por Ana Débora Costa
Mascarenhas
Ontem falei aqui de Luiz de Chico Lulú. E invariavelmente me veio
a mente outra figura ilustre da rua do cemitério. Ao lado da casa do Luiz,
havia uma casa em ruínas, lá morava Olímpia, com seu cabelo arrumado a lá Chico
César e sempre com uma flor no topo do coque no centro da sua cabeça. Era uma
negra já com certa idade, mas creio que não tão velha, afinal, as mulheres de
30 a 40 anos daquela época eram consideradas velhas. Ainda bem que hoje não.
Olímpia era alcoólatra e tinha um filho, seu nome assim como todos
da cidade era sempre veiculado ao parentesco, "Tota de Olímpia". Esse
morreu jovem ainda era um rapaz sem controle, lembro que minha mãe fazia sempre
curativos em seus ferimentos, resultado das brigas de rua. Ah, Olímpia, mesmo
morando em uma ruína, sua casa nem portas tinha, vivia arrumada, brincava com a
meninada da rua e sempre cantando, não lembro dela sem o sorriso no rosto.
Lembro que certo dia, perguntei por seu marido, afinal não era
comum mulheres sozinhas, e ela com os olhos marejados disse que havia morrido,
que ela bebia todos os dias pra matar um pouquinho do amor e da saudade que
ainda sentia dele, que a entristecia, e que ele onde estivesse não iria gostar
de vê-la triste. Suas palavras ecoaram em minha mente, pois não entendia um
amor desse tamanho, seria patológico? afinal todos diziam na rua que ela não
era pessoa para se conviver, era doente.
E nessas voltas que o mundo dá. A gente não consegue diferenciar
se o amor é grande, e precisa ser morto um pouquinho todo dia, pra não doer
tanto, como ela o fazia todos os dias com o uso de álcool, ou como a personagem
de Ariano Suassuna em o Alto da Compadecida que afirmou trair o marido, apenas
para matar um pouco do amor que sentia por ele todo dia, por ser grande demais.
Ana Débora Costa
Mascarenhas
(*) Engenheira agrônoma, bióloga,
especialista em educação ambiental. Escreve
crônicas para O MUNDO DE DÉBORA (http://deboramascarenhas.blogspot.com.br/)
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