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Esperança, cidade admirável (por Cristino Pimentel)

 


Extraímos do jornal “O Norte” um texto de Cristino Pimentel, que era cunhado de Epaminondas Câmara, por ocasião de uma de suas visitas ao Cemitério “Nossa Senhora do Carmo” em Esperança-PB, na data de finados ao túmulo da família. Na oportunidade, também comenta sobre a festa da padroeira que à época era bem frequentada em nosso município.

Vejamos a impressão do escritor campinense, com o título de “Esperança, cidade admirável”:

“Quando dei a publicidade uma crônica sobre a alegre cidade de Esperança, tive que me reportar ao estado desolador do seu cemiteriozinho, - ainda com aspecto de “quadrado” de vila atrasada – e sugeri que o Prefeito dali devia, pelo menos, erguer o cruzeiro santo que o tempo impiedoso roeu e o deitou por terra, estando os pedaços da madeira apodrecida servindo de entulho na aléa principal. O meu grito amigo não foi ouvido, e parece-me que estou a escutar a censura ao gesto: “enxerido, tu tens nada que ver com a casa alheia, quando na tua o Prefeito tem medo e também não cuida do cemitério!...”. Sim, sou enxerido, por que quero bem a Esperança; o coração que vive comigo nasceu lá...

Nos mortos queridos, guardados em ricos ou pobres túmulos, temos, na terra, um motivo de saudade que nos induz a lembra-los sempre, e lá no céu onde reina a bem-aventurança – assim é a nossa crença – depositamos as nossas esperanças, e, por isso, fazemos preces, ao deitar, e no dia de visita religiosa quando chega Novembro.

Esperança, não deve se apresentar somente como a cidade das festas cheia de alacridade, das festas lindas, onde os corações jovens se enchem de sonhos e os homens quarentões e as mulheres balzaquianas se vestem de entusiasmo e graça non pavilhão de homenagem a Virgem do Bom Conselho, não. Deve mostrar também zelosa das suas tradições, dos seus antepassados e ter em conta a alegria natural que sente todo aquele que cruza as suas ruas cheias de sol ou para no ponto central dos ônibus, para tomar um refresco no pavilhãozinho da praça ao lado do templo católico.

Sentem prazer as pessoas que vão a aprazível cidadezinha de Esperança. A negócio ou a passeio. Em tempo de seca ou de inverno. O seu clima, entre o frio e o calor, produz um sono calmo. E o ar do povo, a jovialidade da sua moçada cheia de gracilidade, ativa o espírito de quem vai ali em busca de impressões. Tem uma população de oito mil almas que vive satisfeita e feliz, acredito, por que o seu Deus construiu no seu seio o “Templo da Alegria”. Tem um comércio bem desenvolvido e florescente. Boas lojas de tecidos, sofríveis casas de ferragens, de estiva, de miudezas, de materiais para automóveis de rádios; cafés bem frequentados e um cinema que reclama um melhoramento ao par da sua civilização. É o empório, no brejo, da cultura da batatinha, da cebola, do feijão, do alho, produtos que suas terras dão bonitos e em grande quantidade. Também o Agave tem nas terras esperancenses um “habitat” igual ao que tiveram, em tempos de ganância, a mandioca e o milho. Estas lavouras quase que desaparecem para darem lugar a planta mexicana, que, se por um lado recebia a bolsa de alguns donos das terras, pelo outro, avoluma a boca sempre faminta do fisco, e cria a crise e a carestia dos gêneros de primeira necessidade e quem sabe lá, aumenta a miséria dos lares pobres que vivem do alugado. Medonho destino...

Os agavieiros vivem como chineses em banquete, arrotando de satisfação, e quando chega a festa da padroeira e a igreja arma o seu pavilhão na rua, para, com amor, com jeito e doçuras angariar dinheiro para um fim social qualquer (a igreja agora está ocupando-se com esses problemas) eles, os agavieiros, derramam generosamente os cruzeiros, no leilão das prendas, - perus assados, galinha recheadas, bolos, frutas, etc. – que as famílias da cidade oferecem para arrematação. E quem mais eleva a alma da disputa é a dona rivalidade, que acalora os cordões azul e encarnado. É uma competição bonita. Um choque de flores contra flores. Dir-se-ia estrelas contra estrelas, desmanchando-se em faíscas na cúpula escura da noite. São senhorinhas, ornamento da sociedade, escolhidas, não a dedo, mas pelo coração, pois há em todas pobres e ricas, a forte crença de que estão fazendo um sacrifício pelo bem da Igreja e por amor ao próximo. E assim trabalham dias e noites a fio, para findarem numa algazarra festiva, vivando o cordão vitorioso, que sai do Pavilhão puxado pela banda de música, e vai até a casa do Prefeito, cantando o hino com que se apresentará para a inocente batalha.

Assisti a esse espetáculo encantador, na última festa lá realizada. Foi um delírio! O vinho da alegria embriagava as almas, como o vinho da Natureza embriaga o espírito dos seus contempladores numa alvorada de primavera!

A festa rendeu cerca de trezentos mil cruzeiros, que, deduzidas as despesas, estão sendo empregadas nas obras de acabamento do ginásio que estão construindo para a educação da sua mocidade em idade escolar.

Esperança é uma terra admirável.

Campina Grande, 18 de Maio de 1952”.

O Ginásio Diocesano de Esperança, pertencente à Paróquia, teve sua pedra inaugural lançada em 1945 na administração do Padre João Honório, mas somente foi concluído em 1953 pelo então pároco Manuel Palmeira da Rocha.

A dúvida que nos resta é em relação a frase de Cristino, quando diz que o coração que bate nele, nasceu em Esperança. Em pesquisa na web há informações que o escritor seria natural de Campina, mas parece ter adotado o nosso município como sua cidade afetiva, talvez pelo fato de sua esposa ter nascido nessa cidade.

Rau Ferreira

 

Referências:

-         ESPERANÇA, Livro do Município (de). Ed. Unigraf. João Pessoa/PB: 1985

-         ESPERANÇA, Revista Centenário da Paróquia (de). Editor Jacinto Barbosa. Esperança/PB: 2008.

-         O NORTE, Jornal. Esperança, cidade admirável (Cristino Pimentel). Edição de 19 de março. João Pessoa/PB: 1952.

-         PIMENTEL, Cristiano. Mais um mergulho na história campinense. Academia de Letras da Campina Grande, Núcleo Cultural Português. Ed. Caravela: 2001.

Comentários

  1. *Comentário postado pelo historiador e Oficial de Justiça José Henriques da Rocha, e enviado através do WhatsApp, às 08:15 h, do dia 01/12/2022*:
    “Infelizmente o presente não pode viver o passado. Sua visita nos anos 50 ao cemitério que, naquela época não era o cemitério de hj. sei que era totalmente diferente, mas, sua visita se estendeu a sociedade viva e, não a morta, as construções, a educação, a saúde, ao comércio, enfim, um povo acolhedor, um povo vivedor, um povo voltado para o social e desenvolvimento do município. isto lhe admirou os recantos do Lírio Verde da Borborema. e, isto, aconteceu há 70 anos atras. Esperança tinha recém-nascido. Na atualidade temos vergonha de dizer: “Esperança foi grande quando era pequena”.
    E, voltando ao Cemitério vou concluir dizendo: Quer saber do poderio econômico de uma cidade vá a 02 locais. 1 na igreja matriz, no outro no cemitério. Então veja bem, se analisarmos por aí, como, Esperança é rica, mas, ao mesmo tempo pobre, pela falta de investimentos principalmente na área social. CAOBE fechado, Campestre fechado, América fechado, Cinema fechado, AALE fechado, Hospital fechado, tudo isto no passado funcionava” (José Henriques da Rocha)

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  2. Muito bom o texto do Cristino!
    Tão bom quanto os dos dois comentaristas seguinte.
    Parabéns pelo resgate, Rau!

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  3. Comentário de Pedro Dias do Nascimento, via WhatsApp em 03/12/2022, às 11:39 horas:
    "Bem interessante o texto do Cristino sobre Esperança, bem como os outros dois dos comentaristas seguintes.
    Valeu por mais um resgate da memória esperancense.
    Parabéns, Rau!" (Pedro Dias)

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  4. Belo resgate, meu irmão. Inclusive com dado censitário. Além da romântica abordagem, declarando amor a terrinha!

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  5. Ainda... Nobre amigo, nesse belo resgate tua dúvida no final, creio, foi pequeno lapso de interpretação. Cristino não diz "que o coração que bate nele, nasceu em Esperança", diz "o coração que vive comigo nasceu lá...". Não me restando dúvida que é o coração da esposa.

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