A
política em nosso município sempre foi um acontecimento à parte. Quem imagina
que os conflitos tiveram início na campanha de ’76 - após a deflagração das
facções “ratos” e “amuados” -, está muito enganado. Não é de hoje que a luta
pelo poder tem colocado irmãos e vizinhos em lados opostos. Vamos ver como tudo
começou!
O “Caso
Esperança”, assim denominada por José Octávio Arruda de Melo, começou nas
eleições de 1950, quando os responsáveis pela disputa envolveram o clero local.
Tal artimanha que se projetou em pleitos subsequentes, com maior ou menor intensidade.
Os
fatos aqui narrados foram objeto de pesquisa deste historiador, deixando claro
que apenas expomos para fins de estudo da conjectura política, sem críticas ou
mesmo julgamento.
As
forças políticas de então estavam concentradas nos seguintes partidos: Partido
Social Democrático (PSD), de Samuel Duarte; a União Democrática Nacional (UDN),
de Júlio Ribeiro da Silva; o Partido de Representação Popular (PRP), de Milton
Ferreira Paiva e, o Partido Libertador (PL), de Dogival Belarmino Costa.
O
prefeito Júlio Ribeiro era alvo de denúncias malversadas, respondendo perante a
Câmara Municipal. Essa situação enfraqueceu a UDN no Município.
Samuel
Duarte revelou “inclinações divorcistas”, o que contrariou o pároco local,
Monsenhor João Honório, que tinha raízes integralistas, ocupando o púlpito para
se opor a sua candidatura.
A par
disto, o Padre João Honório resolve apoiar o ex-seminarista Milton Ferreira de Paiva
(PRP) para as eleições federais de 03 de outubro de 1950. O reverendo se
contrapunha a Samuel Duarte, Presidente da Câmara Federal e chefe local do PSD.
Até então a igreja se mantinha distante das querelas políticas.
A
desavença já vinha desde quando Sebastião Duarte, nomeado prefeito interventor
para Esperança (1940-1942 e 1944), removeu a calçada de batentes da Matriz,
abrindo a passagem em frente a igreja, ligando as ruas do Boi (Epitácio Pessoa)
e Nova (João Pessoa).
O padre
João Honório administrou a paróquia de 1937 a 1951. Tinha fama de ser austero e
conservador, em seus sermões; fazia duras críticas em prol da moral de Cristo.
Era defensor fervoroso do casamento, contra o divórcio e os “amancebados” e
aqueles que frequentavam o “baixo meretrício”. Porém, atendia a pobreza com
coração generoso, razão pela qual era muito querido do povo.
Foi durante
a sua administração paroquial que a antiga capela de três torres foi reformada,
dando origem à igreja com a arquitetura atual.
O PRP
não tinha estrutura organizacional e, por sua modesta situação financeira, não
se permitia alçar grandes voos. Porém, com o apoio do padre ultra
tradicionalista, as suas ligações se positivaram (Sociedade e poder político no
Nordeste: 2001, p. 251).
Milton
Ferreira, opositor de Samuel Duarte, era genro do ex-líder perrepista Acácio de
Figueiredo e, por assim dizer, aparentado de Argemiro de Figueiredo,
interventor que governou o nosso Estado de 1935 a 1940. À época, Argemiro
também exercia mandato federal, sendo um dos deputados constituintes de 1946.
Samuel
Duarte, por sua vez, presidiu a Câmara Federal na mesma época, e sua atuação
política se fazia conhecida na Paraíba. Esperança constituía seu berço telúrico
e principal base eleitoral.
Apesar
da manifesta oposição da igreja, Samuel conseguiu ser reeleito e vencer a
disputa interna em Esperança.
Melhor
sorte não obteve Milton Paiva, que embora tenha sido o candidato mais votado
para a Câmara Estadual, não conseguiu êxito com a legenda do PRP.
Campina
Grande lhe havia dado 187 votos, enquanto que Esperança lhe concedeu 137, numa
eleição bem acirrada em âmbito municipal. Ele recebeu um total de 455 votos no
Estado. Foi a única disputa eleitoral, antes de Milton se incorporar ao
“americismo” do Partido Libertador (PL), e se tornar um educador.
João
Honório, porém, continuou a desafiar Samuel Duarte, a quem venceu, apoiando
outro candidato para na eleição seguinte. Esta foi a gota d’água, a partir da
qual o vigário passou a ser perseguido. A desculpa velada dos politiqueiros foi
a retirada da imagem da Capelinha.
O
monumento havia sido erigido em 1925, em cumprimento a uma promessa feita por
Dona Niná, esposa do prefeito Manuel Rodrigues de Oliveira, sob o lajedo do
Tanque do Araçá, na Beleza dos Campos.
O padre
havia determinado que a santa fosse colocada na Igreja Matriz, retirando a
imagem de N. S. do Perpétuo Socorro do seu lugar de origem. Um dos filhos de
Dona Niná – Nilson Rodrigues -, ficou bastante comovido e teria solicitado de
uma autoridade eclesial o retorno da imagem ao seu lugar de origem.
O
pedido fora atendido de imediato e os devotos da Imaculada Virgem acompanharam
a devolução da santa para a Capelinha.
Esclarece
José Octávio, que houve forte reação das lideranças pessedistas locais, que
levaram o caso até o Bispo Anselmo Pietrulla OFM, em Campina Grande, a quem a
paróquia de Esperança era subordinada.
Damião
Ramos Cavalcante, em discurso de posse na Academia Paraibana de Letras, afirma
que a “campanha chegou a ponto de Samuel ter de dirigir-se ao bispo de Campina
Grande, dom Anselmo Pietrulla, para obter a transferência de Honório, sob a
alegação de que ‘não podemos dividir o rebanho’” (CAVALCANTI, 2007, p. 12).
Assim,
conseguiram a transferência do padre João Honório para Monteiro. Quando então a
cidade recebeu o jovem Padre Palmeira.
Antes
da despedida oficial, se intensificariam as retaliações: lançaram bombas na
“Caza” Paroquial, sendo o vigário obrigado a sair às pressas, no meio da noite,
“sacudindo a poeira das alpercatas, numa clara demonstração de repúdio”.
Monsenhor
Honório, antes de falecer, retornaria a Esperança em duas oportunidades. A
primeira em 1979, na inauguração do Centro Social Urbano/CSU, solenidade
presidida pelo Prefeito Odaildo Taveira. A segunda em 1981, por ocasião de uma
homenagem que lhe foi prestada pela sociedade, capitaneada por Nino Pereira, em
reconhecimento ao seu trabalho paroquiano.
Rau Ferreira
Referência:
- BARBOSA, Jacinto. Revista
Centenário da Paróquia. Paróquia de Esperança. Esperança/PB: 2008.
- CAVALCANTI, Damião
Ramos. Discurso de posse na Academia Paraibana de Letras: 15 out. 2007,
extrato sobre Castro Pinto, Samuel Duarte e Francisco Pereira Nóbrega. S.l.:
S.n., 2007.
- JÚNIOR, Martinho Soares
dos Santos. Obelisco Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. Especialização em
História do Brasil. Professora Maria José Oliveira (orientadora). Universidade
Estadual da Paraíba, UEPB. Campina Grande/PB: 2004.
- OCTÁVIO, José. Sociedade
e poder político no Nordeste: o caso da Paraíba (1945-1964). Editora
Universitária: 2001, p. 251/252.
Muito bom, um olhar de hoje para o ontem. Dá conta de que a história se repete como farsa pelos brasis a dentro.
ResponderExcluirComentário do Professor Jocelino Tomaz de Lima: "Muito bom! essas curiosidades políticas aguçam nosso interesse, mesmo sem ser da cidade de Esperança, são histórias que podem com alguma semelhança ter acontecido em qualquer cidade do interior, o que nos motiva a pesquisar. Parabéns ao Rau pela pesquisa!" (via WhatsApp, em 10/11/2022)
ResponderExcluirRau, sobre esse assunto, já escrevi algumas bobagens sobre o Pé João Honório...
ResponderExcluirNão com tantos detalhes como seu texto nos mostra das suas pesquisas,
Tenho lembrança que te enviei, não sei se você lchegou a ler.
Querendo, eu te reenvio...!