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As parcerias e desafiantes de João Benedito

 


João Benedito Viana foi cantador afamado, muito conhecido na região, que tinha como marco de defesa o brejo paraibano, não obstante buscasse desafios no litoral e sertão.

Começou na cantoria, como todo bom repentista, cantando sozinho, aprendendo as rimas e a versejar; cantando os romances que se decorava dos folhetos para ganhar uns tostões baratos na feira. Porém, a sua métrica desenvolveu-se a ponto de ser considerado o “professor” dos cantadores, e sua reputação se espalhou como “temível” na viola.

Em suas andanças, aceitou desafios com grandes mestres do repente, como Romano da MãeD’água; Nicandro, da Cangalha e seu irmão Hugolino do Sabugi; José Patrício, discípulo de Romano; Silvino Pirauá Lima também discípulo de Romano, Claudino Roseira, natural de Soledade, Paraíba; Zé Duda, mestre de cantoria de grande renome.

Também cantou com Josué da Cruz (1904/1968), a despeito de quem “quase perde a ribeira”; e Manoel Serrador Regino (1906/1996), o qual fazendo pouco de sua vestimenta, obrigou Benedito a contradizer que “o vestir não faz o bom poeta”:

Você anda bem vestido

De gravata meia e liga

Não pense que eu tenho inveja,

E é até bom que lhe diga,

O hábito não faz o monge

Nem paletó é cantiga

 

Disputou ainda com Antônio Correia do Mogeiro/PB (1887/1959) e o não menos ilustre José Alves Sobrinho (1921/2011) que em entrevista citou-o como um dos poetas fundadores que se estabeleceram na região do brejo paraibano.

Foi o primeiro parceiro de Alberto Porfírio da Silva (1926/2006), consoante este relata:

Tive como primeiro parceiro o João Benedito: João Luiz de Brito... Viram o pai dele se chamar Benedito, chamavam-no João Benedito. Com ele viajei muitos tempos, cantei muito, ainda eram todos dois jovens e muito dispostos”.

 

Antônio “Guerreiro” Coelho no livro “Zé Limeira – o poeta do absurdo”, de autoria de Orlando Tejo, narra que exerceu a profissão de repentista durante muitos anos nos sertões da Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Ceará, onde enfrentou os cantadores mais afamados, citando entre eles o poeta João Benedito.

O próprio Orlando Tejo registra o ressentimento de Zé Limeira porquanto já “botaro João Benedito” nos livros, enquanto que o poeta do absurdo era praticamente desconhecido, dada a indiferença dos escritores. Também relata que o jornalista Barbosa Mendes inutilizou um metro de fita magnética, onde estavam contidas as homenagens de Limeira e Gonçalves aos grandes poetas da viola, evocando as pessoas de João Benedito, Alexo Dantas, Severino Pinto, Canhotinho entre outros.

Mas o principal deles, o que mais andou com Benedito, e que também foi por esse iniciado na poesia, quando tinha 15 anos, foi Egídio de Oliveira Lima, com a seguinte indagação, reproduzida por Egídio em seu livro “Folhetos de Cordel”:

Menino, você já tem

Idade para cantar.

Eu vou dizer a teu pai

Que em breve irei te levar

à feira da Santa Rosa

para a gente improvisar.

 

Egídio Lima era filho de Francisco Jesuíno de Lima e Rita Etelvina de Oliveira Lima. Nasceu em Esperança, no ano de 1904, e mudou-se para Campina em 1937.

Nos versos acima citados, que compõe aquele livro, Benedito alude ao avô de Egídio, que também seria cantador, e que lhe faria companhia, opondo-se o seu pai à cantoria, porque não queria ver o menino nesse mundo de viola:

Egídio:

De meu avô sou amado!

A ele falo primeiro,

Conto o caso que se deu,

Como firme o roteiro,

Pois ele indo comigo

Não serei prisioneiro.

 

Benedito:

Esse ponto está certeiro

E seja bem sucedido

Teu avô é um cantor

Já bastante conhecido.

Ele pedindo a teu pai

Fica tudo resolvido.

 

Na época em que ingressou no repente, Egídio ainda morava em Esperança, e foi tutelado por João Benedito, que o levou para cantar nas feiras, ensinando-lhe a métrica. Sobre o colega de profissão, Egídio comenta em seu opúsculo: “Uma das memórias mais prodigiosas que conheci”, acrescentando que sabia de cor mais de dez cordéis escritos por Leandro Gomes de Barros, nunca omitindo a autoria do poeta de Pombal, na Paraíba.

Benedito Viana sabia ler pouco, era quase analfabeto, talvez tenha adquirido as obras do pombalense, ou ouvido nas feiras que frequentava, resolveu decorar para se apresentar, ganhando assim notoriedade com o seu conhecimento sobre a literatura de cordel.

 

Rau Ferreira

 

Referências:

- ARAÚJO, João Mauro Barreto (de). Voz, viola e desafio: experiências de repentistas e amantes da cantoria nordestina. Dissertação de mestrado. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas de São Paulo. São Paulo/SP: 2010.

- FILHO, F. Coutinho. Repentistas e glosadores: Poesia popular do nordeste brasileiro. Ed. A. Sartorio & Bertoli: 1937.

- LIMA, Egídio de Oliveira. Os folhetos de cordel. Editora Universitária/UFPb. João Pessoa/PB: 1978.

- MEDEIROS, Irani (org). Josué da Cruz: o cantador de Serraria. Ed. Ideia. João Pessoa/PB. 2006.

- SOBRINHO, José Alves. Cantadores com quem cantei. Ed. Bagagem. Campina Grande/PB: 2009.

- SOBRINHO, José Alves. Cantadores, Repentistas e Poetas Populares. Bagagem. Campina Grande/PB: 2003

- SOUSA, Murílio Antônio Dias (de). A Estrella da Poesia: impressões de uma trajetória. Instituto de Letras. Pós-Graduação em Letras e Linguística. Universidade Federal da Bahia. Salvador/BA: 2009.

- TEJO, Orlando. Zé Limeira: poeta do absurdo. Cia. Pacífica. Recife/PE: 1997.

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