Pular para o conteúdo principal

De Leandro à Benedito: a poesia de repente

Essa poesia cantada, adotada desde 1729, nos Cariris-velhos, tem origem na ribeira do Sabugi, com influência da canção portuguesa, no hibridismo regionalista que formou o nosso dialeto parahybano. Para Egídio de Oliveira Lima (esperancense, patrono da Cadeira nº 22 da Academia de Letras e Artes do Nordeste), Leandro Gomes de Barros representa a essência deste folclore.
Ele nos lembra que em Esperança, um parente de Nicandro Nunes da Costa, o professor Luiz Gil de Figueiredo, recitava de cor um improviso que exaltava o cordelista:
“Leandro Gomes de Barros
Escritor paraibano,
No ofício de escrever,
Escreve com calma e plano
Tem fama de repentista
Escritor e romancista
Tem folheto mais de mil
É ainda no Brasil,
- o seu primeiro humorista”.

Nas feiras do interior, ele próprio lia os seus folhetos, improvisando versos, que os “matutos” gostavam tanto de ouvir. À sua freguesia, Leandro repetia:
“Leve para casa o folheto
E veja que a história é boa
Pois sendo escrita por mim
Não pode sair a-toa
Pague dois mil reis por ela,
Se você pretende aquela,
Compre a minha coleção
Sendo esta ocasião
De você ficar com ela”.

Para enfrentar Leandro na cantoria, só Hugolino do Sabugi e Nicandro da Cangalha, isto dizia Manoel Raimundo de Barros, cantador pernambucano. E chegando o Benedito, os outros deitam a viola, em respeito ao velho cantador, que de escravo liberto, chegou a maestria, ensinando versos aos iniciantes do repente.
João Benedito morava ali, na rua do Boi, foi cantador afamado, precursor do repente, temível nos brejos parahybanos. Certa feita, cantando com Antônio Correia Bastos, afirmou:
- Antônio eu nunca encontrei
Forte que não destruísse,
Nem peso que eu não erguesse,
Perigo que eu não investisse,
Nem cantador de seu jeito
Que uma hora me resistisse.

Átila Almeida, em seu Dicionário bio-bibliográfico de repentistas e poetas de bancada (1978), escrito em parceria com José Alves Sobrinho, é quem nos diz: Grandes repentistas e preparadores foram Joaquim Sem Fim e João Benedito, segundo a opinião insuspeita de Antonio Ferreira da Cruz, que também foi poeta popular excepcional”.
O próprio Zé Alves teria aprendido a cantar com João Benedito e Manoel Raimundo, após fugir de casa com 15 anos incompletos, levando a viola nas costas.
Para Coutinho Filho (Violas e repentes: 1972), Benedito era “fabuloso”. Não é por menos, que Câmara Cascudo cita o cantador esperancense, em sua obra “Vaqueiros e Cantadores”.
Do cantador esperancense, ainda repercute esta quadra:
“Há entre o homem e o tempo
Contradições bem fatais!
O homem não faz, mas diz!
O tempo não diz, mas faz!
O homem não traz nem leva!
Mas o tempo leva e traz”.

Bendito cantou com Romano, Nicandro e seu irmão Hugolino, Zé Patrício e Silvino Pirauá, Zé Duda, Caludino e Josué da Cruz.

Rau Ferreira
Fonte:
-        LIMA, Egídio de Oliveira. Os cem melhores folhetos de Leandro Gomes de Barros. Revista Ariús. Campina Grande/PB: 1952.
-        ALMEIDA, Átila Augusto F. De, SOBRINHO, José Alves. Dicionário bio-bibliográfico de repentistas e poetas de bancada. Volumes 1-2. Ed. Universitária: 1978, p.

-        FERREIRA, Rau. João Benedito: O cantador de Esperança. Edições Banabuyé. Esperança/PB: 2011. 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Sitio Banaboé (1764)

  Um dos manuscritos mais antigos de que disponho é um recibo que data de 1º de abril do ano de 1764. A escrita já gasta pelo tempo foi decifrada pelo historiador Ismaell Bento, que utilizando-se do seu conhecimento em paleografia, concluiu que se trata do de pagamento realizado em uma partilha de inventário. Refere-se a quantia de 92 mil réis, advinda do inventário de Pedro Inácio de Alcantara, sendo inventariante Francisca Maria de Jesus. A devedora, Sra. Rosa Maria da Cunha, quita o débito com o genro João da Rocha Pinto, tendo sido escrito por Francisco Ribeiro de Melo. As razões eram claras: “por eu não poder escrever”. O instrumento tem por testemunhas Alexo Gonçalves da Cunha, Leandro Soares da Conceição e Mathias Cardoso de Melo. Nos autos consta que “A parte de terras no sítio Banabuiê foi herdade do seu avô [...], avaliado em 37$735” é dito ainda que “João da Rocha Pinto assumiu a tutoria dos menores”. Registra-se, ainda, a presença de alguns escravizados que vi...

Renato Rocha: um grande artista

  Foto: União 05/12/2001 “A presença de autoridades, políticos e convidados marcou a abertura da exposição do artista plástico Renato Rocha, ocorrida no último final de semana, na Biblioteca Pública Dr. Silvino Olavo, na cidade de Esperança, Brejo paraibano. A primeira exposição de Renato Ribeiro marca o início da carreira do artista plástico de apenas 15 anos. Foram expostas 14 telas em óleo sobre tela, que também serão mostradas no shopping Iguatemi, CEF e Teatro Municipal de Campina Grande já agendadas para os próximos dias. A exposição individual teve o apoio da Prefeitura Municipal de Esperança através da Secretaria de Educação e Cultura, bem como da escritora Aparecida Pinto que projetou Renato Rocha no cenário artístico do Estado. Durante a abertura da Exposição em Esperança, o artista falou de sua emoção em ver os seus trabalhos sendo divulgados, já que desenha desde os nove anos de idade (...). A partir deste (...) Renato Ribeiro espera dar novos rumos aos seus projeto...

A menor capela do mundo fica em Esperança/PB

A Capelinha. Foto: Maria Júlia Oliveira A Capela de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro está erigida sob um imenso lajedo, denominado pelos indígenas de Araçá ou Araxá, que na língua tupi significa " lugar onde primeiro se avista o sol ". O local em tempos remotos foi morada dos Índios Banabuyés e o Marinheiro Barbosa construiu ali a primeira casa de que se tem notícia no município, ainda no Século XVIII. Diz a história que no final do século passado houve um grande surto de cólera causando uma verdadeira pandemia. Dona Esther (Niná) Rodrigues, esposa do Ex-prefeito Manuel Rodrigues de Oliveira (1925/29), teria feito uma promessa e preconizado o fim daquele mal. Alcançada a graça, fez construir aquele símbolo de religiosidade e devoção. Dom Adauto Aurélio de Miranda Henriques, Bispo da Paraíba à época, reconheceu a graça e concedeu as bênçãos ao monumento que foi inaugurado pelo Padre José Borges em 1º de janeiro de 1925. A pequena capela está erigida no bairro da Bele...

Dica de Leitura: Badiva, por José Mário da Silva Branco

  Por José Mário da Silva Branco   A nossa dica de leitura de hoje vai para este livro, Badiva, voltado para a poesia deste grande nome, Silvino Olavo. Silvino Olavo, um mais ilustre, representante da intelectualidade, particularmente da poesia da cidade de Esperança, que ele, num rasgo de muita sensibilidade, classificou como o Lírio Verde da Borborema. Silvino Olavo, sendo da cidade de esperança, produziu uma poesia que transcendeu os limites da sua cidade, do seu Estado, da região e se tornou um poeta com ressonância nacional, o mais autêntico representante da poética simbolista entre nós. Forças Eternas, poema de Silvino Olavo. Quando, pelas ruas da cidade, aprendi a flor das águas e a leve, a imponderável canção branca de neve, o teu nome nasceu sem nenhuma maldade, uma imensa montanha de saudade e uma rasgada nuvem muito breve desfez em meus versos que ninguém escreve com a vontade escrava em plena liberdade. Silvino Olavo foi um poeta em cuja travessia textual...

Capelinha N. S. do Perpétuo Socorro

Capelinha (2012) Um dos lugares mais belos e importantes do nosso município é a “Capelinha” dedicada a Nossa Senhora do Perpétuo do Socorro. Este obelisco fica sob um imenso lagedo de pedras, localizado no bairro “Beleza dos Campos”, cuja entrada se dá pela Rua Barão do Rio Branco. A pequena capela está erigida sob um imenso lajedo, denominado pelos indígenas de Araçá ou Araxá, que na língua tupi significa “ lugar onde primeiro se avista o sol ”. O local em tempos remotos foi morada dos Índios Banabuyés e o Marinheiro Barbosa construiu ali a primeira casa de que se tem notícia no município, ainda no Século XVIII. Consta que na década de 20 houve um grande surto de cólera, causando uma verdadeira pandemia. Dona Esther, esposa do Ex-prefeito Manuel Rodrigues de Oliveira, teria feito uma promessa e preconizado o fim daquele mal.  Alcançada a graça, fez construir aquele símbolo de religiosidade e devoção. Dom Adauto Aurélio de Miranda Henriques, Bispo da Paraíba à ...