Pular para o conteúdo principal

José (Dedé) Patrício de Souza: da Mulatinha para o mundo do cordel

Dedé da Mulatinha - em registro documental

O poeta-repentista deixa sempre um legado inestimável. Com efeito, a poesia popular é cheia de sabedoria e transmite muito conhecimento. Aliás, este ao que parece, foi a sua origem, maquiada que fora pela cultura nordestina, era o meio de comunicação dos sertões.
Esperança sempre foi terra de grandes cantadores, a exemplo de Campo Alegre e João Benedito. Neste torrão se reuniam para fazerem a “praça”, nas esquinas do Super Esperança ou da Farmácia de Milena, referências atuais que nos remontam à antiga feira livre.
O encordoamento para a viola era vendido na miudeza de seu Patrício Bastos, razão pela qual acorriam para cá muito dos repentistas, que faziam deste município a sua segunda morada. Assim foi com Josué da Cruz, que por um tempo residiu na rua João Mendes.
Mas o motivo maior deste pequeno artigo é homenagear o já esquecido Dedé da Mulatinha. Batizado José Patrício de Souza, e com a alcunha de “Dedé”, o poeta nasceu no Sítio Mulatinha, zona rural de Esperança, por volta de 1914.
Começou a cantar com 12 anos de idade na feira livre de Esperança. Em entrevista para o documentário sobre o “Patrimônio Cultural de Campina”, afirma que quando chegava em casa seu pai lhe perguntava por onde teria andado, e respondendo que fazia versos na cidade era ameaçado de levar uma surra, pois o seu genitor considerava aquilo coisa de preguiçoso, de gente que não nada com o trabalho. Porém, mesmo assim esclarecia que pessoas importantes do lugar, como Manuel Farias, e até autoridades, como o prefeito e o delegado lhe suplicavam: "menino vem cá, cantar uma coisa prá gente ouvir".
É o próprio Dedé que nos afirma, em versos esse seu início:
“Comecei a minha vida,
De rua, casa e avenida
A cantar com meu ganzá.
Em toda terra do norte
Do nordeste brasileiro
Viajei no mundo inteiro
e hoje estou no meu lugar”.

De sua autoria podemos citar: História Sagrada: As sete espadas de dores de Maria Imaculada; Romeiros do Padre Cícero do Juazeiro do Norte; Descrição da flora medicinal: As plantas que curam. Vejam a seguinte estrofe deste último título:
“O poeta ou bom cantador
Por Deus pai é inspirado
Canta as causas do presente
Descreve o que foi passado
O que é de mais beleza
Da divina natureza
Faz em verso improvisado”
(Descrição da flora medicinal – quais as plantas que curam. Publicação Nº 06. Universidade Federal da Paraíba. Campina Grande/PB: 1977).

O seu irmão Toinho – que também enveredou pelos caminhos do cordel – iniciou nesta lida com a idade de 10 anos. Nesse aspecto, disse-me o jurista e historiador João de Patrício, que muitas vezes assistiu Dedé e Toinho na esquina da rua do Sertão com um ganzá na mão e uma bacia em frente, cantando para uma multidão de curiosos e espectadores.
Ambos deixaram como legado uma vasta lista de cordéis, levando o nome de Esperança inclusive fora do Estado. O próprio Toinho chegou a lançar um disco de emboladas, em parceria com Chico Sena. Enquanto Dedé percorreu o mundo vendendo os seus folhetos e se apresentando em praça pública.
Dedé faleceu aos 84 anos, após mais de 60 anos dedicados à poesia popular. Sua obra pode ser encontrada na “Bibliotheque virtuelle Cordel” da Université de Poitiers e na Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos. E segundo se comenta por aqui, a sua arte é estudada na Universidade de Sorbone, na França.

Rau Ferreira

Fonte:
- O Patrimônio Cultural de Campina Grande. Documentário. MinC/FNC Nº 110/96. Maria Cristina Gomes Negrão (Idealização/Coordenação). Mariene Braz Barros Cavalcante (Coordenação administrativa). Realização NO AR. Universidade Estadual da Paraíba. Museu de Artes Assis Chateaubriand. Campina Grande/PB: 1997.

- Blog Esperança de Ouro, editor: Jailson Andrade. Disponível em: http://esperancadeouro.blogspot.com, acesso em 13/02/2016. 

Comentários

  1. Um valioso artigo sobre Dedé da Mulatinha, com ricos detalhes sobre sua vida. Parabéns, Rau!

    ResponderExcluir
  2. Parabéns! Fiz o poema hoje falando sobre os dois, estarei publicando em o Blog do Martins - O Gari Poeta. Basta pesquisar no meu blog pelo nome "Dedé da Mulatinha"

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Obrigado pelo seu comentário! A sua participação é muito importante para a construção de nossa história.

Postagens mais visitadas deste blog

Severino Costa e sua harpa "pianeira"

Severino Cândido Costa era “carapina”, e exercia esse ofício na pequena cidade de Esperança, porém sua grande paixão era a música. Conta-se que nas horas de folga dedilhava a sua viola com o pensamento distante, pensando em inventar um instrumento que, nem ele mesmo, sabia que existia. Certo dia, deparou-se com a gravura de uma harpa e, a partir de então, tudo passou a fazer sentido, pois era este instrumento que imaginara. Porém, o moço tinha um espírito inventivo e decidiu reinventá-la. Passou a procurar no comércio local as peças para a sua construção, porém não as encontrando fez uso do que encontrava. Com os “cobrinhos do minguado salário” foi adquirindo peças velhas de carro, de bicicleta e tudo o mais que poderia ser aproveitado. Juntou tudo e criou a sua “harpa pianeira”, como fora batizada. A coisa ficou meia esquisita, mas era funcional, como registrou a Revista do Globo: “Era um instrumento híbrido, meio veículo, meio arco de índio: uma chapa de ferro em forma de arc...

A menor capela do mundo fica em Esperança/PB

A Capelinha. Foto: Maria Júlia Oliveira A Capela de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro está erigida sob um imenso lajedo, denominado pelos indígenas de Araçá ou Araxá, que na língua tupi significa " lugar onde primeiro se avista o sol ". O local em tempos remotos foi morada dos Índios Banabuyés e o Marinheiro Barbosa construiu ali a primeira casa de que se tem notícia no município, ainda no Século XVIII. Diz a história que no final do século passado houve um grande surto de cólera causando uma verdadeira pandemia. Dona Esther (Niná) Rodrigues, esposa do Ex-prefeito Manuel Rodrigues de Oliveira (1925/29), teria feito uma promessa e preconizado o fim daquele mal. Alcançada a graça, fez construir aquele símbolo de religiosidade e devoção. Dom Adauto Aurélio de Miranda Henriques, Bispo da Paraíba à época, reconheceu a graça e concedeu as bênçãos ao monumento que foi inaugurado pelo Padre José Borges em 1º de janeiro de 1925. A pequena capela está erigida no bairro da Bele...

A Energia no Município de Esperança

A energia elétrica gerada pela CHESF chegou na Paraíba em 1956, sendo beneficiadas, inicialmente, João Pessoa, Campina Grande e Itabaiana. As linhas e subestações de 69 KV eram construídas e operadas pela companhia. No município de Esperança, este benefício chegou em 1959. Nessa mesma época, também foram contempladas Alagoa Nova, Alagoinha, Areia, Guarabira, Mamanguape e Remígio. Não podemos nos esquecer que, antes da chegada das linhas elétrica existia motores que produziam energia, estes porém eram de propriedade particular. Uma dessas estações funcionava em um galpão-garagem por trás do Banco do Brasil. O sistema consistia em um motor a óleo que fornecia luz para as principais ruas. As empresas de “força e luz” recebiam contrapartida do município para funcionar até às 22 horas e só veio atender o horário integral a partir de setembro de 1949. Um novo motor elétrico com potência de 200 HP foi instalado em 1952, por iniciativa do prefeito Francisco Bezerra, destinado a melhorar o ...

Administração Odaildo Taveira (1979)

Odaildo Taveira Rocha foi eleito pela ARENA 1, com apoio de seu Luiz Martins, numa eleição muito acirrada contra José (Zeca) Torres. Ele que já havia sido vice de seu Luiz (1973-1977), agora se elegia gestor do Município de Esperança, tendo como vice o Dr. Severino (Nino) Pereira. Ex-funcionário de banco, iniciou seus estudos no Externado “São José”, da professora Donatila Lemos. Odaildo também chegou a presidir o Conselho de Desenvolvimento de Esperança que, em parceria com o PIPMOI - Programa Intensivo de Preparação de Mão-de-Obra Industrial, organizava cursos de marceneiros, tratoristas, encanadores e eletricistas a serem ministradas pelo SENAI – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial.   Com relação a sua administração, colhemos dados em uma publicação do parceiro e blogueiro Evaldo Brasil, em seu site “Reeditadas”, o qual publicou um calendário com o resumo do ano de 1979, que passo a reproduzir.   “ Poder Executivo Prefeito: Odaildo Taveira Rocha Vice-pre...

Capelinha N. S. do Perpétuo Socorro

Capelinha (2012) Um dos lugares mais belos e importantes do nosso município é a “Capelinha” dedicada a Nossa Senhora do Perpétuo do Socorro. Este obelisco fica sob um imenso lagedo de pedras, localizado no bairro “Beleza dos Campos”, cuja entrada se dá pela Rua Barão do Rio Branco. A pequena capela está erigida sob um imenso lajedo, denominado pelos indígenas de Araçá ou Araxá, que na língua tupi significa “ lugar onde primeiro se avista o sol ”. O local em tempos remotos foi morada dos Índios Banabuyés e o Marinheiro Barbosa construiu ali a primeira casa de que se tem notícia no município, ainda no Século XVIII. Consta que na década de 20 houve um grande surto de cólera, causando uma verdadeira pandemia. Dona Esther, esposa do Ex-prefeito Manuel Rodrigues de Oliveira, teria feito uma promessa e preconizado o fim daquele mal.  Alcançada a graça, fez construir aquele símbolo de religiosidade e devoção. Dom Adauto Aurélio de Miranda Henriques, Bispo da Paraíba à ...