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A tradição das rezadeiras em Esperança

A data é imemorial. Ninguém pode precisar quando se iniciou essa prática religiosa. Alguns poderão afirmar que é resquício da Idade Média e outro que a crendice popular veio ao Novo Mundo trazido pelos colonizadores, silvícolas, aventureiros ou imigrantes escravizados. Mas o fato é que a tradição das rezadeiras e benzedeiras faz parte da nossa cultura. Ela pode se contrapor a fé – dirão alguns -, mas não queremos adentrar neste mérito em respeito à liberdade religiosa.
Itapuan Bôtto Targino foi quem melhor definiu essa manifestação popular:

representa a liderança mística do povo que, com seus recursos, procura minimizar a dor e o sofrimento de sua carência, substituindo e assumindo a função de terapeuta da alma e do corpo” (Saberes e fazeres do povo: resgate da cultura popular na Paraíba. Revista AMPB. Gráfica JB: 2008).

O ensinamento é repassado pela oralidade. As mais velhas ensinam as mais novas a “reza” que mistura elementos religiosos e conhecimento empírico. Santos são chamados e os passos de Jesus na terra lembrados. “Mandai para as águas profundas do mar”, dizem.
A característica principal das benzedeiras é a fé inabalável. Em segundo lugar, elas costumam cultivar plantas em seus quintais, de onde tiram ramos e folhas para as suas rezas.
Espanta-se mau olhado, inveja e ambição “nas carnes e no espírito”. Raízes e folhas são adicionadas e quando o ramo resta murcho é porque as forças eram muito negativas.
As doenças espirituais mais conhecidas são espinhela caída, ventre caído ou virado e fogo selvagem. O quebranto só é curado depois de três dias consecutivos de oração.
O mau olhado vem do olho mau, invejoso. O ventre caído ou virado é uma doença que acomete as crianças. Causa mal estar, vômitos e diarréias. A benzedeira vira a criança de cabeça para baixo e bate com a palma das mãos nos pés do infante. Espinhela caída ou lumbago é uma doença que causa dor na boca do estomago e nas pernas e sensação de cansaço. Fogo selvagem ou pênfigo é uma doença que faz nascerem bolhas na pele e nos casos mais graves erupções internas.
No momento da reza ninguém pode passar em frente, nem pegar no ramo depois, pois os fluídos são absorvidos pela planta que deve ser jogada fora.
As crianças são as principais freguesas das rezadeiras, mas adultos também se submetem a seus mistérios.
Fala-se muito em mulheres, mas há homens que também rezam. Não e muito comum, devemos admitir, mas fazem com igual competência.
Em nosso município, as principais benzedeiras são: Josefa, Severina, Maria, Pedro e Ciça. Por questão de privacidade, preferimos omitir os seus sobrenomes, mas quem não conhece em sua rua ou bairro uma velha rezadeira? Com a palavra o caro leitor...
Entretanto, os pais desconhecem o poder da benção aos filhos. Trazemos ainda a mácula do pecado original, mas como batizados renascemos para a vida em Cristo. Os pais têm sim o poder de orar e rezar pelos seus filhos afastando o mal e curando-lhes de alguma doença espiritual, inclusive impondo-lhes as mãos. Em qualquer caso, poderá pedir a intercessão de Jesus sobre a criança que certamente a graça será alcançada.


Rau Ferreira

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