Pular para o conteúdo principal

Origens da cantoria com João Benedito


A cantoria de viola nasceu do reisado, folguedo do ciclo natalino, onde os reis vinham adorar o menino Jesus. A tradição vem do tempo da escravatura. Dele nos dá notícia José Alves Sobrinho, no memorável texto "A viola e o tempo".
João Benedito, poeta popular, cantador e repentista, embora tenha nascido livre, bebeu dessa água para compor os seus versos já tão decantados pelo nosso povo. Apenas para refrescar a memória, vamos citar aqui as contradições do tempo:
Há entre o homem e o tempo
contradições bem fatais,
O homem não faz, mas diz,
O tempo não diz mas faz,
O homem não traz nem leva,
Mas o tempo leva e trás.

Era da família Pichaco, de Zé Luiz da Sorda, conhecido por festejar o “13 de maio” em Esperança. Seus irmãos, Adauto e Honório eram calejados no coco, uma das modalidades da cantoria; só o canastrão Pedro não levava jeito para a poesia, vivendo de aprontar das suas nas feiras, cujas aventuras já foram por mim publicadas em livro.
Depois veio a viola e seus desafios e em cada vitória uma delas saia mais enfeitada do que a outra, uma tradição que remonta aos anos 40. A cantoria ultrapassou gerações e mesmo hoje é respeitada em todo o Nordeste.
João Viana dos Santos – João Benedito – nasceu em Esperança, na rua do Boi que ficou assim conhecida pelo curral que encerrava aquela artéria, já no início da rua de Areia (que seguia para o Brejo de Areia).
Veio ao mundo no ano de 1860, falecendo em 1943. Benedito alcançou o tempo em que se cantava em sextilhas, como estas que falam do nosso cantador:
O Viana de Esperança (35)
Eu ouço desde menino!
Tem memória e peito fino,
Canta e glosa abertamente!
Faz gosto ouvir o repente
do cantador nordestino!

Estes versos foram recolhidos por Francisco Coutinho para o seu livro “Repentistas e Glosadores”, publicado em 1937.
Nas pesquisas que encetei, está João Viana entre os mestres precursores do cordel. Ele próprio confessa, em uma de suas cantorias, ter participado desses desafios com Nicandro da Cangalha e seu irmão Hugolino, José Patrício e Silvino (Velho) Pirauá; além de ter vencido Claudino Roseira de Soledade, Zé Duda e com Josué da Cruz.
Josué era natural de Serraria, com ele Benedito “quase perdeu a ribeira”; residiu por algum tempo em Esperança, onde o Viana tinha seu marco de defesa.

Rau Ferreira


Referências:
- FILHO, F. Coutinho. Repentistas e glosadores: (Poesia popular do nordeste brasileiro). Ed. A. Sartorio & Bertoli: 1937.
- LIMA, Egídio de Oliveira. Os folhetos de cordel. Editora Universitária/UFPb. João Pessoa/PB: 1978.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A Pedra do Caboclo Bravo

Há quatro quilômetros do município de Algodão de Jandaira, na extrema da cidade de Esperança, encontra-se uma formação rochosa conhecida como “ Pedra ou Furna do Caboclo ” que guarda resquícios de uma civilização extinta. A afloração de laminas de arenito chega a medir 80 metros. E n o seu alto encontra-se uma gruta em formato retangular que tem sido objeto de pesquisas por anos a fio. Para se chegar ao lugar é preciso escalar um espigão de serra de difícil acesso, caminhar pelas escarpas da pedra quase a prumo até o limiar da entrada. A gruta mede aproximadamente 12 metros de largura por quatro de altura e abaixo do seu nível há um segundo pavimento onde se vê um vasto salão forrado por um areal de pequenos grãos claros. A história narra que alguns índios foram acuados por capitães do mato para o local onde haveriam sucumbido de fome e sede. A s várias camadas de areia fina separada por capas mais grossas cobriam ossadas humanas, revelando que ali fora um antigo cemitério dos pr

A menor capela do mundo fica em Esperança/PB

A Capelinha. Foto: Maria Júlia Oliveira A Capela de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro está erigida sob um imenso lajedo, denominado pelos indígenas de Araçá ou Araxá, que na língua tupi significa " lugar onde primeiro se avista o sol ". O local em tempos remotos foi morada dos Índios Banabuyés e o Marinheiro Barbosa construiu ali a primeira casa de que se tem notícia no município, ainda no Século XVIII. Diz a história que no final do século passado houve um grande surto de cólera causando uma verdadeira pandemia. Dona Esther (Niná) Rodrigues, esposa do Ex-prefeito Manuel Rodrigues de Oliveira (1925/29), teria feito uma promessa e preconizado o fim daquele mal. Alcançada a graça, fez construir aquele símbolo de religiosidade e devoção. Dom Adauto Aurélio de Miranda Henriques, Bispo da Paraíba à época, reconheceu a graça e concedeu as bênçãos ao monumento que foi inaugurado pelo Padre José Borges em 1º de janeiro de 1925. A pequena capela está erigida no bairro da Bele

Barragem de Vaca Brava

Açude Vaca Brava, Canalização do Guari (Voz da Borborema: 1939) Tratamos deste assunto no tópico sobre a Cagepa, mais especificamente, sobre o problema d’água em Esperança, seus mananciais, os tanques do Governo e do Araçá, e sua importância. Pois bem, quanto ao abastecimento em nosso Município, é preciso igualmente mencionar a barragem de “Vaca Brava”, em Areia, de cujo líquido precioso somos tão dependentes. O regime de seca, em certos períodos do ano, justifica a construção de açudagem, para garantir o volume necessário de água potável. Nesse aspecto, a região do Brejo é favorecida não apenas pela hidrografia, mas também pela topografia que, no município de Areia, apresenta relevos que propiciam a acumulação das chuvas. O riacho “Vaca Brava”, embora torrencial, quase desaparece no verão. Para resolver o problema, o Governador Argemiro de Figueiredo (1935/1940) adquiriu, nos anos 30, dois terrenos de cinco engenhos, e mais alguns de pequenas propriedades, na bacia do açude,

O Mastodonte de Esperança

  Leon Clerot – em sua obra “30 Anos na Paraíba” – nos dá notícia de um mastodonte encontrado na Lagoa de Pedra, zona rural de Esperança (PB). Narra o historiador paraibano que em todo o Nordeste existem depressões nos grandes lajeados que afloram nos terrenos, conhecidas pelo nome de “tanques”, muitas vezes obstruídos pelo material aluvionar. Estes são utilizados para o abastecimento d’água na região aplacada pelas secas, servindo de reservatório para a população local. Não raras as vezes, quando se executa a limpeza, nos explica Clerot, aparecem “ restos fossilizados dos vertebrados gigantes da fauna do pleistoceno que povoou, abundante, a região do Nordeste e, aliás, todo o Brasil ”. Esqueletos de espécimes extintas foram encontradas em vários municípios, soterrados nessas condições, dentre os quais se destaca o de Esperança. A desobstrução dos tanques, necessária para a sobrevivência do rurícola, por vezes provocava a destruição do fóssil, como anota o professor Clerot: “ esf

Versos da feira

Há algum tempo escrevi sobre os “Gritos da feira”, que podem ser acessadas no link a seguir ( https://historiaesperancense.blogspot.com/2017/10/gritos-da-feira.html ) e que diz respeito aqueles sons que frequentemente escutamos aos sábados. Hoje me deparei com os versos produzidos pelos feirantes, que igualmente me chamou a atenção por sua beleza e criatividade. Ávidos por venderem seus produtos, os comerciantes fazem de um tudo para chamar a tenção dos fregueses. Assim, coletei alguns destes versos que fazem o cancioneiro popular, neste sábado pós-carnaval (09/03) e início de Quaresma: Chega, chega... Bolacha “Suíça” é uma delícia! Ela é boa demais, Não engorda e satisfaz. ....................................................... Olha a verdura, freguesa. É só um real... Boa, enxuta e novinha; Na feira não tem igual. ....................................................... Boldo, cravo, sena... Matruz e alfazema!! ........................................