O matuto roceiro tem certa desconfiança de “dotô”. Na verdade,
entre essas duas profissões, há um ranço antigo de quem leva a melhor. Cada um
no seu fazer, acha que o outro trabalha menos e leva uma vida melhor ou põe-se
gabando de sua força de trabalho.
A crônica a seguir, lembrada por Zé Cavalcanti, aconteceu no
município de Esperança. Nestas paragens havia um produtor rural abastardo
chamado Zé João que na época das campanhas políticas era muito procurado pelos
candidatos, tal qual ainda hoje acontece nas grandes famílias de agricultores.
Conta-se que Rui Carneiro foi até a fazenda de Zé João chegando
ali através de um cabo eleitoral. Chegando na propriedade foi recebido com
muita festa, todos queiram apertar a mão do Senador, prestar-lhes os
cumprimentos. Observando o político o mói de gente e sem ter muito assunto pra
puxar, perguntou ao fazendeiro quantos filhos tinha:
- Tenho treze – respondeu Zé – doze
home e uma muié.
- E tem algum formado? - perguntou o
Senador.
- O sinhô tá perguntando se tem algum
doto?
Antes que o político pudesse
responder, Zé João apontou para um cachorro que dormia num canto de parede, e
disse:
- Quem sabe porque não tenho nenhum
filho doutô, é esse cachorro velho!
Como assim “esse cachorro”, perguntava-se
o candidato.
- Sim, esse cachorro – respondeu o
agricultor – que ele já veve rouco de acuá os doutô que vem me Tuma dinheiro
imprestado...
Com essas palavras caíram na risada, pois o momento era de
descontração.
Entre a matutagem, corriam uns versos que se não me falhe a
memória era mais ou menos assim:
Cachorro bom é pedrigueiro
Bicho preguiçoso é doutô
Um sente da caça o cheiro
O outro, da caça o dinheiro.
Fogos subiam fazendo um grande estrondo. A gurizada corria no
terreiro. Os homens bebiam cachaça, davam gargalhadas e esqueciam a dura labuta
no campo. Depois de uma tirada dessas, que mais queria saber de doutô?
Ruy Carneiro foi interventor na Parahyba (1940-1945), e Senador
por esse Estado durante 26 anos.
Em suas disputas gostava de utilizar o mote: “Forte é o povo”,
razão pela qual as suas campanhas eram bastante populares.
Rau Ferreira
Referência:
-
CAVALCANTI, José. Att all. Seu Zé da
Paraíba: um livro de humor baseado na vida e na obra de José Cavalcanti.
Editora Ahimsa: 1986.
-
CARNEIRO, Rui. Alice Carneiro. Imagem da
Mulher Paraibana a Serviço das Grandes Causas Sociais. Senado Federal.
Brasília: 1977.
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